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Tempo incerto: O mar

Portugal possui uma ligação ao mar que marca a História e o imaginário da Nação.

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José Vitorino Guerra

Portugal possui uma ligação ao mar que marca a História e o imaginário da Nação. Nas últimas décadas, os governos viraram costas ao mar e amarraram o País ao continente europeu. Os decisores políticos foram incapazes de explorar as vantagens da nossa posição geográfica entre a África, as Américas e a Europa, ou as características de um País disperso no Atlântico.

Os últimos grandes projectos ligados ao mar foram lançados no Estado Novo: os estaleiros da Lisnave, na Margueira, hoje desactivados, e o porto de águas profundas de Sines.

Na sequência da ressaca da perda do Império e após a adesão à CEE, reduziu-se a frota de pesca, abateu-se a marinha mercante, extinguiram-se as grandes companhias de transportes marítimos e a marinha de guerra reduziu a sua capacidade operacional. A incompreensão da natureza geopolítica de Portugal levou ao agravamento da dependência face ao exterior.

Portugal funcionou em sentido contrário ao da globalização, que veio intensificar o comércio marítimo internacional e reforçar a importância da nossa posição geográfica.

O abandono do mar torna-se incompreensível quando cerca de 60% do comércio externo português ocorre por via marítima, bem como a generalidade das importações, incluindo a totalidade do petróleo e cerca de 2/3 do gás natural. Portugal possui, ainda, soberania ou jurisdição sobre uma área marítima superior a 18,7 vezes a área terrestre continental. É o mar que nos pode tornar singulares no todo europeu. O mar trouxe-nos riqueza e comércio no passado e representa um activo de crescente valor para o futuro. Basta pensar no potencial de exploração dos recursos marinhos e nas actividades económicas, industriais e científicas relacionadas, desde o turismo, à expansão da aquacultura, à preservação da biodiversidade e à construção naval.

O futuro dos Estaleiros de Viana do Castelo (ENVC) devia ser decidido no âmbito de uma estratégia para o mar. Os ENVC são os únicos com capacidade para construir navios até 37.000t e que, devido a sucessivos erros políticos e de gestão, foram transformados num drama social e nacional.

A desastrosa solução adoptada para os ENVC está à altura de um governo que entregou a ANA ao monopólio privado da Vinci, os CTT à Goldman Sachs e a outros investidores estrangeiros e a EDP e a REN a empresas controladas pelo Partido Comunista da China.

Escrito de acordo com a antiga ortografia

(texto publicado na edição de 19 de dezembro de 2013)