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Ansiolítico urbano: Meninos do rio (I)

Uma vez chamei-lhe “mote eterno de mudança”. “Mote”, em vez de “pretexto”, leitmotiv ou outros nomes, porque “mote” vem de mot e mot significa palavra. “Eterno” porque pode lá estar sempre. E “de mudança” porque, todos os dias, se faz passado do que parecia estar a estrear. Vai chegar o dia em que é preciso mudar outra vez.

Ana Bonifácio, arquitecta urbanista ab@anabonifacio.com

Uma vez chamei-lhe “mote eterno de mudança”. “Mote”, em vez de “pretexto”, leitmotiv ou outros nomes, porque “mote” vem de mot e mot significa palavra. “Eterno” porque pode lá estar sempre. E “de mudança” porque, todos os dias, se faz passado do que parecia estar a estrear. Vai chegar o dia em que é preciso mudar outra vez.

A palavra é Lis e Lis é o mote. A edição do RL de 11 de Novembro mostrou-nos que nos 39,5 quilómetros que distam do senhor António que vive no quilómetro zero do Lis, ao senhor Göran da autocaravana, se podem encontrar o senhor Luciano e filha a tratar do gado, o senhor Manuel agricultor com adega e a dona Alice que, como a vizinha de 88 anos, lava a roupa no rio. Entre pontas, passamos pelo quiosque da Paula e por todos os fatos-de-treino que o Polis fez vestir.

Hoje, esta “ansiedade” não é a de um espaço público novo para quem sai do escritório. Diz a UE que 2027 é o prazo para termos um Lis limpo. Seria perfeito podermos vir a fazer, até lá, um passeio de quase 40 quilómetros em cada uma das margens. Seria perfeito porque tudo o resto estaria tratado. Mas há este rio de meninos crescidos que precisa de algo diferente do que uma nova “política de cidades”. Em 2027, o menino Manuel (a quem, diz ele, foi junto ao rio que nasceram os dentes), terá 84 anos. E a vizinha da dona Alice, 104. E a mudança quase não começou.

(texto publicado na edição em papel de 25 de Novembro de 2011)