Assinar

Ansiolítico urbano: Território tragicómico

Da última ansiedade – “a cidade que era bela” e que reclama medicação – ainda me (provavelmente ‘nos’) move a angústia do desacerto entre as necessidades e as oportunidades.

Ana Bonifácio, arquiteta urbanista ab@anabonifacio.com

Da última ansiedade – “a cidade que era bela” e que reclama medicação – ainda me (provavelmente ‘nos’) move a angústia do desacerto entre as necessidades e as oportunidades. Se é verdade (ou for) que quanto mais há das primeiras mais pode haver das segundas, por ora, esse não é o momento. A isto que se vive hoje já lhe chamaram “a transição”. Porque a mudança não é superficial e é pesada.

Pergunto-me se já estamos nessa espécie de território futurista sem futuro, ou se – quero acreditar – ainda estamos na transição onde (e apesar das absolutas necessidades e das mal mascaradas e nada cintilantes oportunidades) ainda será possível acordar e não ver o pardacento da pele, a errância dos passos e os olhos assustados de uma mole humana sem arquétipos nem ideias para incubar.

Coincidência: Acabo de receber o seguinte mail: Exma. tal-tal: “O Governo Português vai lançar (…) a iniciativa ‘Portugal Sou Eu’ com o objetivo de valorizar a oferta nacional, promover o emprego e dinamizar a economia”. Devo eriçar-me com a ideia de ser este Portugal – “Portugal sou eu, o tanas!” – ou sentir-me contente por se ver o braço esbracejar no pântano?

Irremediavelmente isto deixa marcas bem terrenas. O palco de tudo é um território mutante que se esvazia da sua efetiva importância, se transforma por “desinvestimento” e se reduz a apenas chão destes (todos) atores.

(texto publicado a 7 de dezembro de 2012)