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Passageiro do tempo: No, we can’t

José Manuel Silva Professor/gestor do ensino superior jmsilva.leiria@gmail.com
José Manuel Silva
Professor/gestor do ensino superior
jmsilva.leiria@gmail.com

Trump percebeu que a única forma de fazer frente à China é aliar-se a Putin. À UE resta apanhar sozinha os cacos do edifício que tem vindo a destruir

“Não, não podemos”, é o contrário da célebre expressão de Obama, “Yes, we can” (“Sim, podemos”). Infelizmente, neste seu final de mandato, já é indisfarçável que muitas coisas não puderam ser feitas e muitas não estiveram à altura das esperanças que o primeiro presidente afroamericano dos Estados Unidos da América criou um pouco por todo o mundo. Independentemente do balanço dos seus mandatos, fica para a história o feito de ter sido eleito presidente sendo da cor dos escravos africanos que ajudaram a América a tornar-se grande e, com ele, diferente.

Mas não terá sido por acaso que o final do mandato fica manchado pelos insucessos no Médio Oriente onde Obama termina encostado às cordas, para utilizar linguagem do boxe, por uma coligação integrando a Rússia, a Turquia e a Síria e onde os países da União Europeia apoiantes da estratégia do presidente americano deixaram de ter qualquer papel visível.

Aliás, toda a estratégia Euroamericana para a região, em particular para a Síria, foi um desastre que conduziu à quase destruição deste país, à eclosão do DAESH, à migração para a Europa de centenas de milhares de refugiados e à desestabilização de toda a região. E a eleição de Trump resultou, entre muitos outros fatores, da incapacidade de Hillary Clinton para apresentar uma alternativa estratégica que afastasse os fantasmas de uma não vitória no vespeiro da Síria, Líbia e Iraque onde as apostas de Obama foram quase todas perdedoras.

Agora “Não, não podemos” fazer mais do que limitar os estragos da liderança russa na região com a Turquia a defender o seu Curdistão e a Síria transformada num protetorado do Kremlin, com os EUA em recuo e a Europa fora da corrida.

Trump percebeu que a única forma de fazer frente à China é aliar-se a Putin. À UE resta apanhar sozinha os cacos do edifício que tem vindo a destruir.

(Texto publicado na edição de 12 de janeiro de 2017)