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Passageiro do tempo: Umbiguidades portuguesas

A política vale o que vale, mas a importância que se lhe dá em Portugal é claramente desproporcionada.

 

jmsilva.leiria@gmail.com

 

O país tem uma dívida pública astronómica, a produtividade é baixa, as exportações não aumentam, a natalidade é uma maldição, o aumento da longevidade é um desafio, o mundo está em mudança acelerada em termos de modelos civilizacionais, alianças políticas, desafios societais, ameaças climáticas.

Mas em Portugal, o tema do momento é o familygate, como se fosse algo novo, quem estiver inocente que atire a primeira pedra, como já se percebeu, e o que espanta é como todos nos deixamos envolver nesta novela sem fim, permitindo que o debate nacional descambe para temas mediáticos, mas menores, ignorando-se os problemas verdadeiramente importantes do país.

Não, que considere que nomear filhos, maridos, primos, e outros parentes, para cargos públicos seja um facto banal, certamente não é, mas a consciência nacional convive bem com isso, está-nos na massa do sangue. Aqui a tradição também já não é o que era e o que ontem se olhava com bonomia, agora gera indignação. O problema é dar-se mais relevo a questões de balneário, do que de estratégia política, económica e social.

O título desta crónica reflete o que nos parece ser esta versão de um país que vive a olhar para o seu umbigo em vez de abrir as janelas do mundo e olhar lá para fora. A política vale o que vale, mas a importância que se lhe dá em Portugal é claramente desproporcionada face às grandes questões do desenvolvimento do país e aos problemas do mundo que, como é sabido, nos condicionam de forma fortíssima.

Vamos ter eleições europeias em breve, basta olhar para os cartazes que por aí estão para percebermos a vacuidade do discurso e a completa falta de estratégia para eleições relevantes para o nosso futuro, bem mais importantes, embora menos suculentas, do que olhar pelo buraco da fechadura do Governo. Claro, ataca-se onde dói, mas dói muito mais noutras áreas e ninguém quer saber?

 

(Artigo publicado na edição de 11 de abril de 2019)