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Helena Vasconcelos

Médica

O meu diário: Chefs

hml.vasconcelos@gmail.com

A única profissão que parece ter aumentado o seu prestígio social nos últimos 10 anos foram os cozinheiros que passaram todos a chefs. Médicos, professores, juízes têm vindo a perder importância e notoriedade, estando mesmo à beira da desclassificação. Dirão que tudo isto é mal de inveja e não deixarão de ter razão, que eu cá não sou capaz de empratar, confitar, caramelizar , reduzir ou mesmo brasear. Sim, que trufas de limão em cama de espinafres e sardinha recheada com cuscuz aromatizadas com maracujá e frutos vermelhos, não estão acessíveis a qualquer comum mortal. No meu caso, uma mucosectomia ou colocação de gastrostomia percutânea endoscópica também deve chegar para o confronto. Em linguagem hermética e erudita estão a milhas os juízes que conseguem debitar duzentas palavras sem que percebamos pouco mais do que os artigos e palavras de ligação.

Esta admiração talvez resulte das fardas, mas quer as togas quer os nossos uniformes não ficam atrás dos barretes e aventais dos chefs.

Eu acho que é mesmo pela imagem positiva que tem o ato de comer e dos aromas e sabores com que os chefs nos inebriam. Tribunais e hospitais têm quase sempre imagens negativas que nos conduzem para problemas e aflições. Tecnicamente, os chefs, também são atrativos pois não há nada mais fascinante do que o esquartejar da cebola ou o picar dos coentros. As especiarias e os moinhos da pimenta levam-nos a viajar, a imaginar que saímos deste retângulo e já chegamos à Índia, a Itália ou mesmo ao Japão, onde tudo é bonito e saboroso.

Os professores estão nitidamente mais abaixo porque nem fardas, nem linguagem, nem concursos, nem séries na televisão os promovem. Resta-lhes tentar incluir uma personagem na telenovela, mas provavelmente teria que andar a toque de antidepressivos, cheia de problemas com ameaças de alunos e encarregados de educação. Já sabem quando quiserem orientar a vocação dos vossos filhos não se esqueçam de por chef nas primeiras a recomendar. Não se vão arrepender.

(Artigo publicado na edição de 14 de novembro de 2019 do REGIÃO DE LEIRIA)