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Dia do Médico de Família: infelizmente, um dia para cada vez menos pessoas

“Atualmente, uma em cada dez pessoas não tem médico de família”, alerta o médico Rafael Henriques, por ocasião do dia mundial dedicado a estes profissionais de saúde.


Rafael Henriques
Médico de Medicina Geral e Familiar
Leiria

O Dia Mundial do Médico de Família é celebrado a 19 de maio, data em que se procura dar destaque ao papel que o médico de família desempenha, não apenas na saúde, mas, na sociedade em geral. Tal se deve ao facto de o médico de família ter um perfil muito especial de competências e de ser, no seu essencial, um médico de proximidade, quase familiar. Idealmente, é o ‘advogado’ do seu utente, que vai conhecendo ao longo do tempo numa abordagem holística, centrada na pessoa, e com quem acaba por edificar uma relação muito própria.

Considerando isto, naturalmente, se percebe o porquê de o médico de família se apresentar como o eixo central dos cuidados de saúde primários (CSP), onde coordena uma equipa de saúde familiar, e, através destes, ter sido o alicerce para os restantes níveis de cuidados do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

A aclamação do SNS como um dos grandes ganhos do pós-25 de Abril deve-se ao facto de ter disso por intermédio do SNS que se garantiu, efetivamente, a possibilidade do direito à saúde para todos, como está plasmado no artigo 64 da Constituição da República.

Atualmente, e em números conservadores, o que se verifica é que uma em cada dez pessoas não tem médico de família. E entre estas pessoas, encontram-se também as das mais frágeis da sociedade, aquelas a quem ter um MF é uma necessidade vital. Refiro-me a crianças, grávidas, idosos, doentes, imigrantes, desempregados, e até refugiados.

Assim, não ter médico de família significa que, em termos práticos, se está a coartar, logo à partida, o direito ao acesso pleno ao SNS, o que constitui em si mesmo uma forma de discriminação e de limitação da liberdade, ao mesmo tempo que ignora por completo o espírito do referido artigo 64.

Atualmente, uma em cada dez pessoas não tem médico de família. E entre estas pessoas, encontram-se também as das mais frágeis da sociedade, aquelas a quem ter um médico de família é uma necessidade vital

Obviamente, existem outros aspetos relevantes e merecedores de reflexão sobre o papel do médico de família e o SNS, mas este em particular, e especialmente no atual contexto de crise pandémica e económico-social, tem que se constituir como o principal foco de preocupação de todos, indo ao encontro dos anseios daqueles que devem ser os recetores de atenção e cuidado por parte do médico de família , os utentes e respetivas famílias.

Infelizmente, por laxismo, medo, até mesmo por ineptidão, deparamo-nos com um Governo que, apesar de renovado com uma maioria absoluta, aparenta desistir de querer resolver o problema ao demitir-se de definir metas realistas para reduzir o número de portugueses sem médico de família, desculpando-se com conjunturas, e sem propostas de fundo, estruturais e integradas. A este ritmo, o Dia do Médico de Família estará condenado a ser um dia para cada vez menos pessoas.

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