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O meu diário: Jovens

Sou a primeira defensora dos jovens e também uma das suas principais críticas. Depois, como tenho bastantes dessa faixa etária lá em casa quase tudo me pode acontecer, pelo que me devia abster de cuspir para o ar.

Helena Vasconcelos, médica hml.vasconcelos@gmail.com

Sou a primeira defensora dos jovens e também uma das suas principais críticas. Depois, como tenho bastantes dessa faixa etária lá em casa quase tudo me pode acontecer, pelo que me devia abster de cuspir para o ar. Mas não consigo, foge-me o pé para a dança.

Um sábado destes ia no meu carro a caminho do hospital quando distraída numa rotunda ao chegar-me para a minha mão não reparei que estava já lá um carro pelo que recebi merecidamente um reparo sonoro ruidoso. Deixei passar o carro e após a passagem coloquei-me atrás dele. Na tentativa de pedir desculpa, sim que eu a conduzir sou uma senhora e gosto dos por favores, dá licença e desculpe lá, cheguei-me ao carro, para que a condutora, porque era uma senhora que conduzia, me visse levantar a mão apresentando as desculpas pelo erro cometido. Era um carro pequeno cheio de jovens adolescentes e pareceu-me aquele programa típico do sábado á tarde, de mãe leva filhos e amigos dos filhos ao treino de futebol ou outra coisa do género. Quando dou por mim um dos jovens cá atrás tinha elevado o traseiro e pumba baixado as calças em sinal de protesto para a minha infração ao código da estrada. Sim, sim mostrou-me o rabo de uma forma ostensiva insolente e provocatória. A mim, à minha pessoa que sou especialista em rabos! Rapidamente fiz uma avaliação sumária e apeteceu-me enviar-lhe o relatório completo da inspeção perineal e anal para que a coisa tivesse algo de profissional. Ri-me até fartar mas não deixei de ficar a pensar se aquilo tudo seria apenas irreverência e não teria já um toque de delinquência. Alguns dias depois recebo um telefonema de uma mãe de um doente meu, adolescente, a contar que o filho lhe tinha batido e se eu achava se podia ter sido da medicação. Era mesmo da má criação e nunca tinha sido descrito nos efeitos adversos agressões a pais ou familiares chegados, respondi. Dei uma verdadeira descasca ao garoto que me prometeu que se ia portar bem. Qual o meu espanto ao constatar na consulta seguinte que o bom comportamento tinha sido premiado com um telemóvel topo de gama.

Também não sei se sei educar, também não sei se tudo o que faço vai dar resultado mas para quem tem filhos parece-me a tarefa prioritária e a de maior responsabilidade. Mesmo quando tudo parece não estar a correr bem fica sempre alguma coisa inscrito no carácter de cada um. É um esforço que vale sempre a pena.

(texto publicado na edição em papel de 15 de junho de 2012)