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O meu diário: Pai Natal

Como vês [Pai Natal] eu tenho muito potencial. E o que peço em troca? Muito pouco. Davas-me guarida até ao Natal de 2013. Fugia ao IMI, IRS, IRC, IVA e outras abreviaturas desagradáveis.

Helena Vasconcelos, médica hml.vasconcelos@gmail.com

Ai Pai Natal, Pai Natal, já não aguento o 2012.

Leva-me para a Lapónia no regresso, leva-me contigo. Vou no trenó escondida e não te hei de chatear muito, prometo. Vou caladita que és rapaz para te chateares com mulheres tagarelas. Que poderei fazer por lá? Medir-te a tensão arterial e ver-te a glicemia. Receitar-te medicamentos para a azia. Não me digas que és saudável com esse perímetro abdominal, tens risco de doença cardiovascular e só podes ter colesterol elevado. E deve ser do mau, que é o que costuma atacar as pessoas bondosas. Vá lá por favor, posso ser tua secretária e ajudar-te a responder às cartas que recebes. Podia fazer uma carta tipo, por pedido, e mais personalizada para quem merecer mais, quem se tiver portado bem, ajudado os outros. Para enfermeiros a pedir emprego, para mães a pedir filhos de volta no seu país, de gente a pedir condições para ter filhos. Fazíamos a coisa mais profissional tipo ofício e em papel timbrado. Podia ser a tua diretora geral ou gestora do departamento de marketing.

Se quiseres podemos gerar cartas espontâneas, o chamado Pai Natal proativo, e recomendar coisas que façam o país singrar. Que dizes? Se tu também desanimas que será deste povo luso? E tu és um homem empreendedor: já assinaste um protocolo com a Coca-cola e com uma data de shoppings, estás bem na vida. Podíamos mudar-te a cor do fato conforme o clube. Esquece o verde que não tem saída, só azul e vermelho. Podias experimentar barba de três dias, como é moda no momento, e ver o que é que as balzaquianas diziam. Podes assinar pela McDonald’s. Também podias assinar por uma ração para renas, e quem sabe por um iogurte que reduz o colesterol. Logo a seguir ao Natal, depois dos exageros gastronómicos, devia ter muita saída.

Como vês eu tenho muito potencial. E o que peço em troca? Muito pouco. Davas-me guarida até ao Natal de 2013. Fugia ao IMI, IRS, IRC, IVA e outras abreviaturas desagradáveis. Escusava de ver isto a afundar-se tranquilamente. Pode ser que quando voltássemos já o furacão tivesse passado e fosse tempo de recolher os destroços. Só me resta um pormenor: lá em casa somos cinco. Há Erasmus na Lapónia?

(texto publicado a 21 de dezembro de 2012)