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Passageiro do tempo: O sonho português

Cristiano Ronaldo é o mais emblemático exemplo do sonho português, do menino nascido pobre, com uma infância difícil, a quem os fados vaticinavam uma existência sem notícia mas que conseguiu fintar o destino.

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José Manuel Silva, professor/Gestor do ensino superior jmsilva.leiria@gmail.com

Por estes dias não há como fugir ao futebol e a todo o ambiente criado à volta de mais um campeonato do mundo, este ano no Brasil, de repente transformado num campo de batalha social para surpresa de muitos habituados ao fervor futebolístico do povo brasileiro e à loucura da torcida. Mas não tenhamos ilusões, nem todos os brasileiros são torcedores, nem as manifs dos últimos tempos são apenas inocente expressão de gente descontente. Mas isto são outros contos.

Do outro lado, o do sortilégio do futebol, temos os craques e as suas vidas de sonho, o fulgor incomparável e o fascínio dos jogos, das emoções à solta, das derrotas dramáticas, das vitórias sofridas e épicas, de um número incontável de gente de todo o mundo, de todas as crenças, das mais diferentes culturas e estratos sociais, irmanada por uma mística comum em volta de uma bola a rodopiar nos pés dos mágicos que fazem esquecer mágoas e tornam possíveis todos os sonhos.

Cristiano Ronaldo é o mais emblemático exemplo do sonho português, do menino nascido pobre, com uma infância difícil, a quem os fados vaticinavam uma existência sem notícia mas que conseguiu fintar o destino e tornar-se o melhor jogador do mundo, respeitado por todos e idolatrado por muitos. Não é só na América que estas coisas acontecem, aqui também há gente que singra contra ventos e marés, uns no futebol e outros noutros campos, a existência de Portugal como país livre e independente é, em si mesma, um hino à capacidade de superar as adversidades e de alcançar objetivos ambiciosos.

Olhando para o passado, quem acreditaria que o gesto de rebeldia de Afonso Henriques poderia vir a originar um país independente que possui as fronteiras mais estáveis e antigas da Europa? Perante a força esmagadora de Castela nunca Portugal abdicou da sua independência e fez do mar a força que o continente lhe negava e da emigração a saga patriótica da sobrevivência sempre dolorosa.

Mesmo que a seleção portuguesa não ganhe o mundial e Ronaldo não consiga ser o melhor marcador da Copa nada nem ninguém deslustra o facto de Portugal ter chegado até aqui, de Ronaldo ter alcançado o topo do topo, de tudo nos provar que não há impossíveis e que o sonho, o trabalho árduo, a perseverança, que estão ao alcance de todos, movem montanhas. O sonho português é real e os portugueses são a prova disso.

(texto publicado na edição de 19 de junho de 2014)