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Ansiolítico urbano: Território estica-encolhe

Mesmo em tempo de gruas adormecidas e expectantes pela hora de nova ereção, muitos governantes portugueses acreditam que para atrair povo ao seu burgo é preciso criar novos espaços onde se possa, por exemplo, construir, comprar e vender a casa com garagem, jardim, churrasco, alpendre e mais anexo.

Ana Bonifácio, arquiteta urbanista ab@anabonifacio.com

Mesmo em tempo de gruas adormecidas e expectantes pela hora de nova ereção, muitos governantes portugueses acreditam que para atrair povo ao seu burgo é preciso criar novos espaços onde se possa, por exemplo, construir, comprar e vender a casa com garagem, jardim, churrasco, alpendre e mais anexo.

Mesmo em tempo de obras de santa engrácia ou de nula fertilidade urbana – no sentido de se gerar ‘coisa’ com massa e escala crítica que vá para além da gestão do território que, no dia-a-dia, tem mesmo de se fazer – há autarcas crentes na solução de “comer” solo rural (muitas vezes “vomitado”, a seguir, como urbano) na expectativa de qualquer investimento (quero acreditar) a bem final do domínio público coletivo, da geração de postos de trabalho ou, simplesmente, da criação de espaço que fixe gente com ideias fecundas.

Mesmo em tempo de números recordes em apartamentos, maisons ou monos edificados completamente vazios, insiste-se em não ver, não pensar e não reformular o que já está feito.

Vale para os grandes centros urbanos e vale para os pequenos. Vale para o litoral (um elástico que já não estica mais) e para o interior (onde é preciso pôr elasticidade – entenda-se: refuncionalizar, recapacitar, regenerar – no que já lá está e com os que ainda lá estão): O futuro já não mora (só) em casas a estrear. E as cidades que aí vêm, já chegaram.

(texto publicado na edição em papel de 22 de junho de 2012)