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À boleia do programa Erasmus, alunos da Marinha Grande fazem estágio em Itália

Foi a primeira experiência no mercado de trabalho de Mara, Alexandra e Roberto, alunos da Escola Profissional e Artística da Marinha Grande, e não podia ter sido mais especial e desafiante. Graças ao programa Erasmus, fizeram estágio de um mês em Itália.

Estar num novo país, descobrir uma cultura, língua e rotinas diferentes é já desafiante por si só. Fazê-lo ao mesmo tempo que se tem a primeira experiência no mercado de trabalho coloca o desafio num outro patamar.

Mas com a preparação, a orientação adequada e apoio local, as vantagens superam em muito os obstáculos. Quem o confirma são Mara Ferreira (18 anos), Roberto Grumete (17 anos) e Alexandra Buyan (18 anos), estudantes da Escola Profissional e Artística da Marinha Grande (EPAMG), que embarcaram para Itália, no dia 16 de março, para um mês de estágio em Rovigo.

Para Roberto, estudante do segundo ano do curso de Eletrónica, Automação e Comando, foi uma estreia a todos os níveis: nunca tinha estado no estrangeiro, nem andado de avião. Já Mara, finalista de Marketing, Relações Públicas e Publicidade, estava habituada a viajar e, por isso, ajudou os colegas a orientarem-se no aeroporto e tranquilizou-os na hora da partida. O REGIÃO DE LEIRIA também embarcou no voo para acompanhar os primeiros dias da estadia dos jovens em Itália (*).

Acompanhados pela diretora da EPAMG, Patrícia Rosa, e pela professora Telma Santos, Mara, Roberto e Alexandra aprenderam a viver longe de casa, a ser mais autónomos, e desenvolveram inúmeras capacidades que, dizem agora ,levar tanto para a vida profissional que os espera, como para a vida pessoal.

Quando chegaram a Itália, os locais de estágio eram ainda desconhecidos. Apesar de ter sido feita uma entrevista por videochamada com o parceiro, em Itália, Luca Fonti, diretor executivo da empresa Muoversi.EU, foi em Rovigo, nos primeiros dias, que foram escolhidas as empresas de estágio, após visita dos alunos às mesmas.

Enquanto Alexandra, por exemplo, ficou logo na primeira empresa que conheceu, Mara acabando por se juntar depois à equipa da loja RCE Foto, em Rovigo, a segunda que conheceu.

No primeiro dia naquela cidade no norte de Itália, os alunos reuniram com Luca Fonti nas instalações da Muoversi.EU, para receber orientações sobre as regras do alojamento onde iriam ficar com outros estudantes. Puderam também tirar dúvidas, saber mais acerca da cidade e perceber como iria funcionar toda a experiência de estágio.

Seguiram-se dias agitados, com visitas a espaços culturais, experiências gastronómicas e idas a empresas, na companhia de Patrícia Rosa e Telma Santos. No período da manhã, os alunos começaram também a ter aulas de italiano, para aprender algumas expressões simples, do quotidiano, nomeadamente formas de cumprimentar, dizer o nome e a naturalidade, ou aprender os números em italiano.

Durante a primeira semana, os jovens tiveram a companhia das docentes, mas depois ficaram por conta própria em Rovigo. E foi aí que a aventura propriamente dita começou. Mara, Roberto e Alexandra tiveram de se adaptar a novas rotinas, ir às compras, preparar refeições e gerir o tempo da melhor forma, para aproveitar ao máximo a experiência Erasmus, seguindo o conselho das professoras: tirar o máximo proveito do estágio, mas também da cidade e do país, fazendo novas amizades e criando redes de contactos.

Passado um mês, após muitos momentos de stress, dúvidas, mas acima de tudo entusiasmo, alegria e gratidão, os alunos aterraram em Portugal com a bagagem cheia de memórias inesquecíveis.
Mara diz que adorou viver em Itália. “Conheci pessoas novas, fiz amizades incríveis”.

Roberto, que já queria viajar há muito tempo, está agora entusiasmado para voltar a sair do país e “explorar mais”.

Alexandra também garante que “foi uma experiência incrível”. “Profissionalmente, ganhei uma visão mais internacional do mercado de trabalho. A nível pessoal, aprendi a gerir melhor o meu tempo, a lidar com imprevistos e a valorizar as pequenas coisas do dia a dia. Foi um mês intenso, que me tornou mais confiante e madura”, salienta.

Para Mara, o desenvolvimento pessoal foi mesmo a maior vantagem desta experiência: “Acabamos por nos conhecer melhor e saber viver sem o apoio dos pais”, explica, acrescentando que aprendeu a “construir opiniões próprias sobre situações diárias da vida e a saber lidar com elas da melhor forma”.
Viver fora de casa foi algo que impactou Roberto, que ambicionava há já algum tempo partilhar alojamento com outros estudantes. O resultado? Nota que amadureceu e aprendeu a ser mais independente, “tanto na vida profissional, como na vida pessoal”.

Longe das redes sociais

Nesta nova visão que os jovens ganharam do mundo – através da convivência com pessoas de outra nacionalidade – Mara diz que há algo que nunca pensava ser possível alcançar: viver sem redes sociais. Prometeu a si própria que iria aproveitar cada momento em Itália “para ver o mundo e conhecer mais sobre o país”. “Se querias ficar em casa a ver tiktoks, ficavas em Portugal”: era esta a máxima que ia repetindo para se motivar a ocupar os tempos livres com passeios por Rovigo e por outras cidades, saídas à noite, idas a restaurantes. “Raramente estava em casa depois do trabalho”, conta, afirmando que, se não tivesse companhia, ia sozinha.

Tal como acontece nas universidades, com os estudantes deslocados, Mara teve de começar a tratar da roupa, a fazer as refeições, a lavar a loiça. Se não o fizesse, ninguém o ia fazer por ela. E a mãe agradece que a filha agora faça as tarefas sem ser preciso pedir, admite a jovem, divertida.

Preparação para o mercado de trabalho

Depois desta experiência em Itália, Mara e Alexandra sentem-se, sem dúvida, preparadas para enfrentar o mercado de trabalho. Alexandra diz que ficou com uma “perspetiva mais clara do que é esperado” e percebeu em que áreas quer evoluir.

Embora ainda não tenha terminado o curso de Programadora de Informática, acredita que os próximos passos serão dados “com mais segurança e preparação”.

Mara, que já está a efetuar estágio curricular, diz que o trabalho na loja de fotografia ajudou a desenvolver a autoestima, aspeto que considera crucial aquando da integração numa empresa. “Não se fala muito nesse assunto, mas nunca nos podemos esquecer que não é por estarmos num emprego que ele deve ser o pilar principal da nossa vida. Ele não deve tirar mais tempo do que o horário de trabalho, não nos devemos moldar às personalidades com quem trabalhamos, deixando de ser quem sempre fomos, só para ser aceite pelos colegas ou patrão”.

Enquanto jovem-adulta, Mara considera que é necessário saber “receber um conselho construtivo e fazer as mudanças” que são apontadas.

Roberto também nota que tem agora outras competências, mas admite que ainda não se sente 100% preparado para entrar no mercado de trabalho. Por enquanto, quer “aprofundar mais os estudos”.

Falar outra língua e gerir o tempo

Como não sabiam falar italiano e o curso foi curto, a comunicação foi para Roberto e Alexandra uma das maiores barreiras durante a estadia em Rovigo, embora nas empresas conseguissem falar inglês.
A adaptação a um ambiente de trabalho com horários diferentes e a consequente saída da zona de conforto foram também desafiantes para Alexandra, que diz ter aprendido a ser “mais flexível” e a “valorizar o trabalho em equipa, mesmo com diferenças culturais”.

Para Mara, a maior dificuldade residiu na gestão do tempo. Sabendo de antemão que nunca iria conseguir visitar tudo o que desejava, manteve-se de “mente aberta” e com espírito aventureiro para “não cair na armadilha” de se trancar em casa.

Quanto aos estágios propriamente ditos, os três dizem que correram bem. Enquanto Mara ficou a estagiar numa loja de fotografia, Alexandra foi integrada na empresa Evolve, de criação e gestão de softwares; e Roberto ficou na Fornace Fonti SRL, que trabalha na área da construção de casas.

No fim desta aventura, Mara deixa um conselho a todos os estudantes com acesso ao programa de Erasmus: “Façam-no, não se vão arrepender. O pior desta experiência é que ela acaba e passa rápido”.

Mais-valias do Erasmus para os professores

Patrícia Rosa e Telma Santos foram a Itália não apenas para acompanhar os estudantes, mas também para aproveitar a modalidade “job shadowing” (“emprego sombra”, em português). Isto é, durante a semana que estiveram em Rovigo, as docentes visitaram várias empresas, de diferentes ramos – nas áreas da moda, software, fotografia e publicidade, materiais de construção biodegradáveis e equipamentos médico. Conheceram “novas metodologias de trabalho e novas perspetivas do mundo empresarial”.

Para a diretora da EPAMG, esta modalidade de “emprego sombra” permite “perceber que a transmissão de conhecimento/aprendizagem não se reflete apenas nos conteúdos, mas também nas experiências que vamos tendo ao longo da vida”. Esta aprendizagem ao longo da vida possibilita uma atualização “enquanto pessoas e profissionais”, realça.

Telma Santos acrescenta que as novas abordagens aprendidas possibilitam “dar resposta às exigências do mundo de trabalho atual” e levam a uma maior consciência “das relações entre educação formal e informal, o ensino profissional e o mercado de trabalho”.

A EPAMG tem acreditação Erasmus desde 2022 e, nos últimos cinco anos, colocou mais de 50 alunos e mais de 10 professores em mobilidade. Não obstante, os projetos internacionais existem nesta escola desde 2010.

Para Patrícia Rosa, a mobilidade internacional é muito importante para toda a comunidade escolar. Para os docentes, que conhecem novas realidades, diferentes métodos de trabalho e de relacionamento interpessoal. E para os alunos que vão e têm uma oportunidade de “abrir os seus ‘pequenos mundos’ ao ‘grande mundo’ que os espera na vida adulta”. Os estudantes que ficam também beneficiam, no sentido em que os colegas, quando regressam, fazem uma apresentação sobre o que foi a experiência, o que viram, as dificuldades e as mais-valias.

Para a docente Telma Santos, trata-se ainda de uma internacionalização do “saber-ser, do saber-fazer e do saber-estar”, permitindo o “contacto com experiências diferenciadoras na vida profissional e nas áreas de formação, elevando os níveis de empregabilidade”.

É este conjunto de vantagens que leva a EPAMG a continuar a apostar no programa Erasmus, conclui a diretora.

Muoversi nasce para criar cidadãos do mundo

Pode-se dizer que Luca Fonti (na foto ao lado) é um fã incondicional dos projetos de mobilidade internacional. A sua primeira aventura fora da terra natal, Rovigo, foi um ano em Portugal. Conta que adorou a experiência e quando regressou a casa ficou muito inquieto, porque “não tinha mudado nada” em Rovigo. “Todos os meus colegas continuavam chatos, como eu era antes. A vida parecia parada. Eu já não estava bem aqui”.

Fruto dessa insatisfação, da vontade de explorar mais, participou em todos os projetos de mobilidade que existiam à época, até deixar de ter idade para se poder candidatar, por volta dos 27 anos.
Licenciado em Economia, pela Universidade do Minho, percorreu Portugal de norte a sul.

Em 2011, decidiu fundar a Muoversi, que hoje gere com o apoio da companheira Valentina. O projeto arrancou com três alunos e foi crescendo ao longo dos anos. Atualmente, faz a ponte entre as escolas e recebe em média 100 alunos por ano, a maioria de Portugal, que é o país com o qual preferem trabalhar, disse o italiano.

Luca explicou ao REGIÃO DE LEIRIA, no primeiro dia em Itália, que já receberam alunos de várias partes do mundo – Estónia, Espanha, França, Alemanha, entre outros – e os portugueses são os que têm uma forma de interagir mais fácil. “Vejo nos portugueses uma forma de educação que não encontro noutros países”, refere.

Com vários alojamentos em Rovigo, a empresa tem capacidade para receber, em simultâneo, 50 alunos. O objetivo, sublinhou Luca Fonti, é dar ferramentas para que se tornem “cidadãos do mundo, da Europa”. “Quero que eles percebam que pegar numa mala, colocar algumas peças de roupa e mudar para Itália, para a Alemanha ou para a Noruega é a mesma coisa. Não é difícil pegar numa mala e viajar”.

O que deixa Luca mais feliz é a evolução que vê nos jovens, entre a chegada a Itália e o regresso a Portugal. Há alunos que na entrevista “nem conseguem falar” e quando regressam a Portugal “têm muito mais confiança”. “Saem daqui diferentes”, concluiu.

Aos 46 anos, Luca quer continuar a trabalhar para abrir os horizontes aos jovens e simplificar o modo de vida no estrangeiro, procurando sempre encontrar empresas que se encaixem no perfil dos alunos, para que não fiquem desmotivados ou percam a esperança. No final da experiência, há sempre um ou dois alunos, por ano, que recebem uma proposta de trabalho em Itália, adiantou.

(*) O REGIÃO DE LEIRIA foi a Itália a convite da EPAMG