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O que fazem os presidentes quando largam o fato e gravata

Cinzentões? Embrenhados em reuniões sem tempo para mais nada? Nos raros momentos em que a atividade autárquica deixa tempo para o lado B da vida, há autarcas que vivem intensamente

Cinzentões? Embrenhados em reuniões sem tempo para mais nada? Errado. Nos raros momentos em que a atividade autárquica deixa tempo para o lado B da vida, há presidentes de Câmara da região não perdem a oportunidade. Para viver intensamente.

Rui Rocha, presidente da Câmara de Ansião, não resiste a um convite para passar música
Rui Rocha, presidente da Câmara de Ansião, não resiste a um convite para passar música

E se por detrás de um presidente de câmara houvesse um Disc Jockey (DJ) com queda para o futebol e voz de radialista? É assim em Ansião, onde o líder da autarquia, Rui Rocha, passa música em bares e discotecas e joga à bola todas as semanas.

A paixão pela música começou em 1988, tinha o autarca 18 anos. Na altura, Rui Rocha estudava Economia em Coimbra e, quando voltava a Ansião, ao fim de semana, era DJ na discoteca “Star” (onde tinha como colega o mágico Luís de Matos). Pelo meio, tinha ainda tempo para fazer rádio, em emissoras locais de Alvaiázere e Figueiró dos Vinhos, e jogar futebol.

Foi assim durante meia dúzia de anos, até que a vida seguiu outro rumo. Mas a paixão pela música ficou. Hoje, Rui Rocha já não trabalha como DJ, mas não consegue recusar um convite para passar música – como aconteceu, a 28 de dezembro passado, num bar em Ansião.

Passaram-se 25 anos, mas Rui Rocha não perdeu o ritmo. Até porque não costuma estar parado durante muito tempo. Os tempos da “Star”, que entretanto encerrou portas, são recordados anualmente, numa festa realizada por alturas da Páscoa. “No ano passado, juntámos mais de 800 pessoas no Centro de Negócios”, recorda Rui Rocha que, obviamente, foi um dos DJ’s em destaque.

E onde fica o futebol, no meio disto tudo? Na Núcleo de Veteranos do Concelho de Ansião, às quartas-feiras. É lá que, todas as semanas, Rui Rocha treina para os jogos que a equipa disputa um pouco por todo o país. Pontualmente, participa também em torneios de futebol de 7 ou de ténis. “As funções que exercemos na autarquia são temporárias. Não deixamos de ser pessoas e há que continuar a ter espaço enquanto cidadãos”, afirma.

Fernando Lopes, de Castanheira de Pera, conheceu o "amor" BTT há cinco anos
Fernando Lopes, de Castanheira de Pera, conheceu o “amor” BTT há cinco anos

 

E é, em parte, para ter espaço como cidadão anónimo que o presidente da Câmara de Castanheira de Pera, Fernando Lopes, se dedica ao seu hobby: bicicleta. Quando sai para pedalar equipa-se e rigor, o que faz com que quase ninguém o reconheça na rua. “Gosto da sensação de me sentir assim anónimo, mais homem comum”, explica.

O hábito de pedalar é recente. Começou há cerca de cinco anos, na companhia do antigo presidente da Câmara de Pedrógão Grande, João Marques. “O meu desporto não era este, era o futebol, até cheguei a ser federado. Mas tive uma rotura de ligamentos que se agravou com a idade e não é aconselhável correr”, explica. Porém, a pedalar ninguém o para: aos 54 anos percorre 80 quilómetros em estrada e 40 em todo o terreno. No inverno treina só ao fim-de-semana, mas no verão não dispensa os passeios de segunda a sexta, ao fim da tarde. E participa em competições com regularidade. “O entusiasmo aumenta com as provas”, garante.

 

Já o presidente da Câmara de Alvaiázere, Paulo Tito Morgado, não precisa de competições para se empenhar no seu desporto favorito: esqui. Faz férias na neve pelo menos duas vezes por ano, para não perder a prática. “É a minha extravagância”, admite ao REGIÃO DE LEIRIA, poucos dias depois de regressar de Andorra.

Duas vezes por ano, Paulo T. Morgado, de Alvaiázere, não dispensa férias na neve
Duas vezes por ano, Paulo T. Morgado, de Alvaiázere, não dispensa férias na neve

O vício começou nos anos 90. “Na altura era mediador de seguros e recebi como prémio uma viagem à Serra Nevada. Tive umas aulas, fiz muitas nódoas negras, mas ganhei o gosto”, recorda. Entretanto, conseguiu convencer a mulher e os filhos a seguirem-lhe o exemplo. “Na neve há um espírito de camaradagem muito bom, fazem-se férias excecionais em família. Muito melhor do que na praia, onde reina um certo individualismo”, assegura.

É que a família está presente em todas as atividades de tempo livre do autarca. “Não gosto de sair e deixá-los e casa. Ou vamos todos, ou não vai ninguém”, afirma. Para poder partilhar com a família a sua segunda paixão, Paulo Tito Morgado comprou três moto 4 – uma delas de cilindrada baixa, onde os filhos aprenderam a guiar. Durante anos, a família percorria regularmente a serra de Alvaiázere em quatro rodas, mas entretanto perderam o ritmo. “As motas estão todas paradas há um ano”, admite o autarca, que tem vindo a descobrir outros interesses. Recentemente juntou-se à moda das corridas. “Levanto-me mais cedo e corro 50 minutos logo pela manhã. Perco 10 quilos de problemas”, relata.

 

Pesca e fotografia

João Salgueiro, de Porto de Mós, encontra na pesca lúdica uma forma de ocupar o tempo livre
João Salgueiro, de Porto de Mós, encontra na pesca lúdica uma forma de ocupar o tempo livre

E que tal casar a pesca desportiva com a fotografia? É desta forma que João Salgueiro, presidente da Câmara de Porto de Mós, gosta de desfrutar os tempos livres. “À medida que a idade vai passando os hobbies vão-se, também, alterando”, conta. Em tempos, “dedicava algum do meu tempo disponível aos cavalos e aos touros, dos quais ainda sou aficionado, apoiando os meus filhos na competição equestre (resistência) e nos Forcados Amadores Aposento da Chamusca”. Atualmente, o pouco tempo disponível, canaliza-o para o “gosto da pesca lúdica em alto mar”. Mas não só. “Sou amante da fotografia e de viagens, atividades bem mais calmas, diga-se de passagem”, remata.

Mais a sul, em Peniche, sempre que pode, pega na bicicleta e dá uns passeios de BTT. Sexta à noite está reservada para uma partida de futsal com velhos amigos ligados ao futebol. E ao domingo de manhã é altura de pegar na prancha e “deslizar” sobre as ondas nas praias de Peniche. Mesmo assim, António José Correia, presidente da Câmara de Peniche, diz que devia fazer exercício físico de uma forma mais metódica, com mais regularidade.

Mas como é que um presidente de câmara encontra disponibilidade para tanta atividade? “Muitas vezes aproveito muitos dos eventos, que as coletividades e a própria autarquia organizam, para eu próprio fazer”, conta. Foi assim com uma travessia de canoa entre Peniche e a Berlenga, no passeio de BTT de pais Natal na Serra d’el Rei, nas experiências de mergulho na Berlenga, com o ténis, kayak surf e stand up paddle.

António José Correia, de Peniche, apanha umas ondas todos os domingos de manhã
António José Correia, de Peniche, apanha umas ondas todos os domingos de manhã

O desporto acompanha António José Correia desde sempre. Em 1984, por exemplo, participou no I Triatlo de Peniche, a mais antiga prova da modalidade no país. No entanto, foi em 2002 que ficou a conhecer a sua mais recente paixão desportiva: o surf. “Experimentei e gostei muito. Foi a partir daí que obtive a sensação do deslize… Recomendo que todos, um dia, tenham um batismo e acredito que vão ficar com o bichinho”, diz. A arte de se equilibrar em cima da prancha, identificar as manobras e conhecer os termos, valeu-lhe o título de “Mayor mais cool do circuito mundial de surf” e trata por “tu” as grandes estrelas da modalidade.

“As pessoas já me conhecem e sabem que gosto de estar associado ao desporto e boa disposição, não estranham. Hoje sou presidente de câmara, qualquer dia deixo de ser e a minha vida vai continuar. Faço as coisas o mais normal possível”, explica este atleta que não gosta de correr, mas ganha um sorriso quando o desafiam para um passeio de bicicleta.

 

O autarca com ouvido para a música e gosto pela escrita

Paulo Fonseca, de Ourém, não sabe ler pautas de música mas gosta de tocar de improviso
Paulo Fonseca, de Ourém, não sabe ler pautas de música mas gosta de tocar de improviso

Quase não tem tempo, começa logo por adiantar, para se dedicar a vários dos prazeres que vem acalentando desde tenra idade. O presidente da Câmara de Ourém, Paulo Fonseca, tem alma de músico e talentos de escritor, e se lhe faltam as oportunidades para se perder entre bons livros ou a desvendar as músicas do mundo, é sem grande problema que começa a divagar sobre os ritmos do Soweto ou o impacto dos temas do compositor Fernando Lopes Graça. Se não sabe ler música, tem ouvido para o improviso. Na poesia, prefere a crítica social.

Em tempos teve uma banda. Do nome já não se lembra, mas recorda-se do mestre que lhe proporcionou essas primeiras experiências: chamava-se Romão Teodoro Delgado, um cabo verdiano casado com uma senhora de Caxarias, já falecido, que deu algumas aulas de música a jovens pelo concelho de Ourém, através das quais nasceu a banda. Os adolescentes passavam o seu tempo a ouvir cassetes para “tirar as letras” e depois no improviso recriavam as músicas que tocavam.

Paulo Fonseca não se alonga, eram coisas do género de baile, que “qualquer miúdo de 17 anos” gostava de fazer. Lembra que antes mesmo da Banda passou pelo Coral Infantil de Ourém, a realizar este ano os 40 anos, e que ao longo da vida se envolveu sempre na música, de forma sobretudo autodidata. Toca viola, mas não sabe ler uma pauta.

Outro dos seus passatempos passa pela escrita. “Eu acho que o país hoje precisa muito de quem passe para o papel a expressão de um conjunto de ideias que são fundamentais”, explica, revelando que os seus textos, alguns poemas, são sobretudo de crítica social. “Tenho esperança de acabar esta ocupação estonteante em que me envolvi e poder passar a escrito um conjunto de coisas que são contributos sociais relevantes”, refere.

Em Pombal, o presidente Diogo Mateus também elege as letras como a atividade que mais tempo livro lhe absorve: “leio muito”, revela. Ainda assim, não dispensa uma corrida na manhã de sábado, seguida de uma partida de ténis, sempre que possível. O surf é já, praticamente, uma memória do passado. No verão ainda se aventurou, mas a verdade é que até já emprestou a prancha a uma amiga. O resto do tempo livre é canalizado para a família. Pai de três filhos, reparte-se em passeios de bicicleta, jogos, puzzles e mesmo ponto de cruz. Leu bem, ponto de cruz. “Fui eu que lhes ensinei a fazer ponto de cruz”, adianta.

Jorge Abreu jogou futebol federado em Figueiró dos Vinhos e é presidente do clube
Jorge Abreu jogou futebol federado em Figueiró dos Vinhos e é presidente do clube

Não muito longe, Jorge Abreu, presidente da Câmara de Figueiró dos Vinhos, lamenta que o tempo não lhe chegue para manter viva a paixão pelo futebol. “Joguei futebol federado em Figueiró dos Vinhos, a extremo direito, médio ala, e tenho algum fascínio pelo futebol e desporto em si”, revela. “Quando deixei de jogar, aos 28 ou 29 anos, devido a uma intervenção cirúrgica aos ligamentos, dediquei-me ao associativismo”. Atualmente, preside à Associação Desportiva de Figueiró dos Vinhos, funções que deixará em breve, pois está em final de mandato. Com 49 anos de idade, de quando em vez ainda pratica futebol. “Jogo com uma equipa de veteranos da ADFV, mas sou muito pouco assíduo, o tempo não chega para tudo”. Do mesmo se queixa Álvaro Pereira, presidente da Câmara da Marinha Grande. Dedica  a maior parte do seu tempo útil ao município, pelo que “o pouco tempo que me resta é dedicado à leitura e à família, que tento compensar das minhas ausências nos sete dias da semana e até de férias”.

 

Corridas e bom humor

“Não faço nem mais 1… quilómetro”. Este é o nome do grupo de caminhadas que conta com Fernando Tinta Ferreira. Ele é, adivinhou, presidente da Câmara de Caldas da Rainha. “Sempre que posso e tenho tempo, integro um grupo informal de caminhadas, que tem animado a cidade às quartas-feiras”, explica, lembrando que o fenómeno foi replicado das quartas-feiras repletas de corridas em Leiria. “Uns fazem caminhadas, outros corridas… Eu ainda não tenho condição física para a corrida”. Para trás ficam os tempos em que, conta, “era bom em velocidade e salto em comprimento, em competições escolares”. No entanto, “nunca fui bom na resistência. Já na política sou muito resistente”, ironiza.

Em Óbidos, o autarca Humberto Marques costuma jogar na companhia de velhos amigos
Em Óbidos, o autarca Humberto Marques costuma jogar na companhia de velhos amigos

No concelho vizinho de Alcobaça, Paulo Inácio precisa de recorrer ao passado para encontrar os momentos mais animados, exteriores à lufa-lufa autárquica. O grupo de Teatro Amador de Carrascas, já extinto, pode experimentar os seus dotes de ator. O ténis de mesa e o xadrez foram modalidades que praticou e em que competiu. Agora, falta-lhe o tempo. Mas é sportinguista. Passatempo? “Sou sportinguista ferrenho”, diz. E isso, sabemos , é uma atividade a tempo inteiro.

Humberto Marques, líder do município de Óbidos, também não resiste aos encantos do desporto rei. O rei Cristiano Ronaldo até estagia no concelho com frequência, ao serviço da seleção.  E o presidente do município também pratica há vários anos. “Sempre que posso jogo futebol com velhos amigos na minha aldeia, o Arelho, no campo de relva sintética”. Mas nos tempos que correm, “jogo apenas aos fins de semana e mais esporadicamente”, confessa. A leitura, sobretudo de livros técnicos de agricultura, é outro dos pontos de interesse onde consome algum tempo livre.

“A prática de andebol, a leitura de livros e de revistas temáticas, e o cinema são as atividades a que me dedico nos meus tempos livres, bem mais curtos desde a chegada à presidência da Câmara da Nazaré”, revela Walter Chicharro. A família é a prioridade nos tempos de lazer “e o tempo que sobrar, dedico-o a atividades de que gosto”, diz. O andebol é o seu deporto de eleição.

 

Com a fantasia "escocês", Walter Chicharro, é adepto do tradicional Carnaval da Nazaré
Com a fantasia “escocês”, Walter Chicharro, é adepto do tradicional Carnaval da Nazaré

Iniciou-se aos 13 anos por influências familiares. O tio, João Manuel Chicharro, foi determinante. ”Foi meu treinador”, revela. E ainda consegue dedicar algum tempo à modalidade: “às sextas-feiras à noite ou aos fins de semana, juntamente com amigos, companheiros de longa data”. Afinal, esta é atividade garantiu-lhe vários títulos na juventude. “Fui várias vezes Campeão Distrital nas camadas jovens e seniores, e Campeão Universitário de Lisboa, durante dois anos”, conta.

 

Paulo Batista Santos, presidente da Câmara Municipal da Batalha, tem na leitura, no cinema e no desporto os seus principais hobis. A ida ao cinema é mesmo uma espécie de ritual de família. No campo da leitura, as preferências editoriais vão essencialmente para as áreas da política e da economia.

No campo desportivo, o futebol que reúne as preferências do autarca. Uma lesão têm o impedido de treinar, como era seu hábito, com a equipa de futsal do Fundo dos Trabalhadores do Município da Batalha.

Leia o trabalho na íntegra, na edição de 16 de janeiro de 2013.

CSA/CG/ML/MG/MR/SMF

Paulo Batista Santos, da Batalha, costuma treinar futsal com a equipa do Fundo dos Trabalhadores do Município
Paulo Batista Santos, da Batalha, costuma treinar futsal com a equipa do Fundo dos Trabalhadores do Município

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