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Desporto

Levar a correr quem não pode, enche o coração

Impossível não faz parte do vocabulário do NEL-Pédatleta. A mais recente causa é levar pessoas com mobilidade reduzida a correr e sentir o vento no rosto

“Faz ter adrenalina, andar rápido, apanhar vento na cara e é fixe”. A descrição é de Rafael Andrino, após completar uma prova de trail, em Coentral, Castanheira de Pera, na serra da Lousã, dois anos depois de lhe ser diagnosticada uma encefalomielite aguda disseminada que lhe retirou a mobilidade.

Uma das atividades que Rafael Andrino prefere é a passagem dentro dos rios.... a correr (Foto: AXTRail)
Uma das atividades que Rafael Andrino prefere é a passagem dentro dos rios…. a correr (Foto: AXTRail)

O jovem de Caranguejeira, Leiria, era um praticante de atletismo promissor que chegou a competir no Olímpico Jovem. O vírus que atingiu a medula espinal, sem aviso prévio, afastou-o do sonho de correr. Mas Rafael Andrino, de 17 anos, não é rapaz de baixar os braços e viu o regresso às corridas mais perto no mês de outubro, no AX Trail. Por cima de muros, dentro do rio e um nível de dificuldade elevado, percorreu 10 km em pouco mais de duas horas.

O desafio partiu do NEL-Pédatleta que, nos últimos meses, tem promovido atividades com joelette, uma cadeira adaptada que permite transportar pessoas com mobilidade reduzida em trail ou percursos pedestres. “O tripulante participa na prova que todos os outros atletas vão fazer. O que uma pessoa dita normal faz, e que para uma cadeira de rodas é completamente impossível, nós conseguimos”, explica Miguel Silva, um dos responsáveis do NEL neste projeto.

A principal diferença é que o atleta vai sentado na cadeira e é conduzido e puxado, no mínimo, por duas pessoas. Depois existem ainda elementos de apoio, para o tripulante e para os transportadores, ou seja, uma equipa de, pelo menos, seis elementos. “São caretas voluntários do NEL, que se disponibilizam e dão a conhecer o equipamento. Depois, cada caso é um caso. Já transportamos deficientes por acidente e por doença, com trissomia21, idosos e até invisuais”, conta Hélia Veríssimo, outra das responsáveis do grupo, que tem estabelecido contactos com instituições da região.

Confiança absoluta
A comunicação ao longo do trajeto é fundamental e permite criar laços. “Vamos descrevendo os locais onde passamos, deixamos que sintam a água fresca do rio que atravessamos e isso também é importante”, acrescenta.

joelette
Joelette (fonte: Ferriol Matrat)

No final, o sentimento é ímpar para todos. “Dificilmente estas pessoas teriam uma experiência assim. Na meia maratona de Lisboa um dos atletas, no final, disse ‘Este foi o melhor dia da minha vida’”. Isso enche um coração? “Enche vários”, entende.

Emoções ao rubro

Habituado a fazer ultra trails, Miguel Silva diz que o caminho percorrido em joelette em nada se compara. “O ultra trail é uma prova muito introspetiva, que depende única e exclusivamente de nós. Na joelette é o inverso, há ali alguém muito mais importante que nós. E quando acabamos uma coisa e outra, as sensações são completamente distintas. No ultra trail acabar é o conseguir um objetivo pessoal. Na joelette, as emoções exponenciam-se. O nível de dureza não tem comparação, mas o nível de gratificação é muito superior”, confessa.

As competições de joelettes já são comuns na Europa. Por cá começam-se a dar os primeiros passos. Nada que desanime os responsáveis que têm desafios ambiciosos para os próximos meses: participar numa maratona de estrada e várias incursões em percursos pedestres com carácter interpretativo.

“Sempre que não tiverem ninguém para ir, eu estou pronto”, diz Rafael Andrino. Prefere os trilhos na natureza, com passagens em cursos de “água, no meio das árvores, subidas e descidas grandes”, ingredientes a que acrescente outra iguaria: tudo é feito em ritmo de corrida.

Marina Guerra
marina.guerra@regiaodeleiria.pt


Secção de comentários

  • Magda gama disse:

    Ainda bem que há pessoas que dão estas sensações a pessoas que por qualquer razão estão limitadas mas ainda estão VIVAS e querem experimentar novas sensações! E ainda bem que o Rafael NÃO se deixou "vencer" pela doença e está ainda cá para mostrar do que 1 homem é capaz! É assim mesmo Rafael Andrino, de 17 anos: mobilidade não é tudo: cérebro e neurónios é mais! Deixa lá que mostraste a muito homens mais velhos que tu, de que é feito 1 HOMEM a SÉRIO:NUNCA DESISTISTE!

    E MUITOS PARABÉNS a quem faz estas iniciativas: de LOUVAR E AGRADECER!
    Afinal ainda há esperanças de haver HOMENS a sério no concelho e distrito de Leiria: ainda bem que o Rafael PROVOU ISSO!

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