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“A imprensa perde relevância quando se afasta das suas maiores conquistas”

Marco Gomes é o coordenador do mestrado de Comunicação e Media do Politécnico de Leiria

Do seu ponto de vista, que relevância mantém a imprensa no contexto atual, em que estão disseminadas plataformas diversas de comunicação? 

Diante de um horizonte digital caracterizado pela proliferação de plataformas e conteúdos, por ecologias híbridas, ambientes hipermediáticos, comunidades digitais e práticas de desinformação sempre mais sofisticadas, importa compreender que o conceito de comunicação difere do de informação, precisamente o campo privilegiado de atuação da imprensa. O jornalismo e a imprensa fundamentam-se em procedimentos profissionais (técnicas, saber fazer) e na ideia de um campo dotado de valores e normas, ética, deontologia e autorregulação. A imprensa perde relevância quando se afasta das suas maiores conquistas, de princípios como a separação entre factos (relatos) e opiniões, a imparcialidade (vários pontos de vista), a verificação de informações, a identificação das fontes, a recorrência à citação de fontes autorizadas, a restituição dos factos, as competências de pesquisa e a escrita de tipo descritiva, para todos os públicos.  

Como avalia a dinâmica da imprensa local e regional e a capacidade de assegurar as atividades informativa e de escrutínio, nomeadamente no que se refere a esta região de Leiria? 

A imprensa local e regional é, em muitos países, da nossa vizinha Espanha aos Estado Unidos, um dos elementos de maior vitalidade no campo jornalístico, concorrendo com a imprensa de referência nacional de grande informação. O crescimento da imprensa leiriense, em termos de financiamento, recursos humanos, publicações e qualidade, será sempre em proporção ao contributo que a própria imprensa dará para o desenvolvimento do território e das populações locais, em proporção ao esforço que fará para conhecer os interesses e as necessidades das comunidades regionais. Os jovens são sinónimo de emergia e podem dar um excelente contributo para o desenvolvimento da imprensa local e regional leiriense.  

Acredita que a imprensa tem condições para cumprir a sua função com a consolidação do paradigma digital? 

O crescimento do jornalismo enquanto campo discursivo com marcas filológicas próprias, orientado pela ideia de um essencial e um de um acessório (o processo seletivo que redunda numa construção social), enfrentou sempre o espetro da crise, conseguindo ultrapassá-la. O percurso da imprensa ao longo da história foi feito de conquistas, lutas e muitas dúvidas, das ameaças dos novos meios, da rádio e da televisão, das crises de financiamento aos processos de concentração, das questões profissionais à introdução do computador e lutas dos tipógrafos. A imprensa saberá viver em ambientes online e offline, com novas linguagens e formatos, e tornar-se um instrumento de compreensão da realidade ao serviço do leitor-cidadão, útil para ajudar os indivíduos a se autogovernarem. Diria que o digital não é uma ameaça aos desafios mais prementes do jornalismo e da imprensa, tais como abraçar um pouco mais a historiografia do instante no sentido de um jornalismo mais contextualizador, assente na verificação por contraponto a realidades fabricadas, distorcidas ou falsas, no sentido de cada órgão de informação interpretar os factos e dar a sua versão da história.

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