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“Devemos apoiar o jornalismo com firmeza, caso contrário as democracias correm riscos muito sérios”

Luís Simões é o presidente do Sindicato dos Jornalistas

Do seu ponto de vista, que relevância mantém a imprensa no contexto atual, sendo que estão disseminadas plataformas diversas de comunicação?

Eu diria que mantém e reforça a importância porque o digital e a globalização trouxeram, de forma muito vincada, o avanço da desinformação. Eu só conheço uma maneira de combater a desinformação: é com a informação, certificada, feita por profissionais que estão treinados para isso e que são os jornalistas. Neste sentido, o jornalismo é hoje ainda mais relevante do que era quando a desinformação era mais difícil de disseminar. E eu creio que o poder político deve, de uma vez por todas, perceber que corremos demasiados riscos se deixarmos de apoiar o jornalismo. Vivemos tempos em que devemos apoiar o jornalismo com firmeza, caso contrário as democracias correm riscos muito sérios.

As condições para cumprir as funções do jornalismo estão garantidas?

São cada vez mais difíceis, que me lembre sempre se falou da crise das empresas de comunicação. Hoje a crise é muito séria. Como presidente do Sindicato dos Jornalistas, digo-o com propriedade porque já visitei grande parte das redações, dos órgãos nacionais e tenho-me preocupado em visitar os órgãos regionais, tenho ido a vários locais e pretendo ir a mais, e as redações estão muito depauperadas, falta gente para trabalhar, faltam jornalistas. E isso é difícil, porque quem trabalha tem de fazer o dobro, muitas vezes sem tempo para pensar e para verificar. Mas vai conseguindo, com muito esforço, cumprir a sua missão. E gostava de deixar claro que, por muita crise que viva o jornalismo, continua-se a fazer bom jornalismo e os jornalistas, por uma questão de paixão, tentam em cada momento da sua vida, serem jornalistas e verificarem as informações.  E isso é bom. A exceção é o contrário.

Como vê a dinâmica do sector local e regional e será que ele ainda consegue assegurar as atividades informativas e de escrutínio e qual a perspetiva sobre a realidade de Leiria?

Leiria, apesar de tudo, acaba por ser uma exceção porque ainda tem órgãos locais de Leiria. E há um estudo que fala de uma percentagem elevada de concelhos com total deserto informativo. E não podemos conviver com esse deserto informativo. O cavalgar da desinformação é ainda mais grave nas regiões, pois os grandes jornais nacionais têm cada vez menos gente, as notícias vão-se afunilando, e são referentes aos grandes centros urbanos. Estamos a deixar grande parte do nosso território vulnerável à desinformação. Aí, a desinformação ganha sempre: se eu não tiver uma rádio local, ou um jornal local ou até uma televisão local, muito mais facilmente se difunde desinformação, porque as pessoas não têm acesso à informação.

Se eu comprar os grandes jornais, não tenho informação de Alvaiázere, que é a minha terra. Para ter informação da minha terra, não a tenho no Público, DN, no JN. É muito raro. Os órgãos regionais desempenham um papel fundamental e que deve ser apoiado, porque isso sim, é serviço público. O que os órgãos regionais fazem é serviço público: estão-se a substituir ao Estado para se cumprir a Constituição, o direito de informar. E eu acho que isso tem que ser mais valorizado.

O que se pode fazer para que esse direito constitucional possa ser assegurado?

Não basta o porte pago. Já fizemos várias propostas. Reuni com o ministro da pasta, Pedro Adão e Silva, que tem a perfeita noção de ser preciso dar um forte apoio à imprensa regional. Mas temos de criar mecanismos para dar um apoio sério ao jornalismo. Neste contexto, dou apenas um exemplo das nossas propostas: ter um voucher de, por exemplo, 20 euros, para cada cidadão gastar em jornalismo. Acho que isso pode fazer toda a diferença. É um apoio que sai barato ao Estado, até porque se protege a democracia sem um grande esforço. Informa-se o cidadão e a democracia fortalece-se porque fica menos vulnerável à desinformação.

Por outro lado, importa reforçar que temos um processo de literacia mediática, já em vários pontos do país. O projeto de literacia mediática que temos feito nas escolas está a ser um sucesso. E isso fará a diferença: damos formação a professores para transmitirem aos alunos e está a correr muito bem. É um caminho muito importante.

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