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“O que o mundo digital nos veio trazer foi uma grande sobrevalorização do que chamamos de imprensa regional e local”

João Palmeiro é o presidente da Associação Portuguesa de Imprensa

Do seu ponto de vista, que relevância mantém a imprensa no contexto atual, em que estão disseminadas plataformas diversas de comunicação? 

A questão da relevância tem mais a ver com os conteúdos que com as plataformas. Em Portugal – e não é assim em todos os países da União o que levanta algumas questões que terão que ser dirimidas no âmbito de uma iniciativa da Comissão Europeia chamada Media Freedom Act, no âmbito desse conjunto legislativo que teremos que resolver algumas questões diferentes de estado-membro para estado membro – a imprensa é a única forma de comunicação jornalística que não está sujeita a quaisquer tipos de limites resultantes do suporte que utiliza. Ou seja, a televisão está sujeita a um encontro entre o que é informação e o que é programação, a mesma coisa diz respeito à rádio. A televisão e a rádio estão sujeitas a questões que têm a ver com a utilização de frequências que são um bem público. No que diz respeito ao cabo, há uma diretiva europeia que se chama de “Satélite e Cabo”, e que determina a forma como, mais uma vez, a informação, o entretenimento e a programação são geridos. A imprensa não tem nada disto. A imprensa apenas está limitada, por um lado pela necessidade do editor estabelecer um estatuto editorial, que é a sua promessa de comunicação com os seus leitores, sejam eles em papel sejam eles no mundo digital, e por outro lado pelo respeito da autonomia, criatividade e independência dos jornalistas. Isto é qualquer coisa que, em nenhum dos outros suportes, tal como nós os concebemos até hoje, se encontra. Só esta visão permite que se assegure, em relação aos cidadãos que a independência e a autonomia dos conteúdos jornalísticos corresponde àquilo que é o estatuto editorial. Estes são os únicos limites para que o jornal informe, traga conhecimento aos seus leitores. Não tem mais nenhuma outra obrigação que limitações ou estruturações em relação à forma como o editor se relaciona com o seu leitor ou com o seu consumidor.

Acredita que a imprensa tem condições para cumprir a sua função com esta consolidação do paradigma digital?

Basta pensarmos nisto, que a situação atual do mercado se encarregou, infelizmente, de nos mostrar como uma grande brutalidade: o preço do papel aumentou de tal maneira que não é mais possível continuar a fazer jornais com a mesma utilização de papel que se fazia anteriormente. É preciso encontrar, no suporte digital, um complemento, para continuar a dizer tudo o que quero dizer ao meu leitor.

Como avalia a dinâmica da imprensa local e regional e a capacidade de assegurar as atividades informativa e de escrutínio, nomeadamente no que se refere a esta região de Leiria? 

O que o mundo digital nos veio trazer foi uma grande sobrevalorização do que chamamos de imprensa regional e local porque, no fundo, trouxe um maior valor à proximidade. Ou seja, ao trazer muita informação não editada e não jornalística às pessoas, sobre o que se passa à sua volta – porque nas redes digitais, ninguém em Lisboa ou em Leiria, vai contar uma história que se passou em França – vou contar uma história que se passou em Lisboa ou Leiria. O principal conteúdo daquilo que as pessoas partilham nas redes ditas sociais, é a proximidade.

Isto acarreta uma grande valorização em relação à informação de proximidade, que pode ser imediatamente validada e utilizada pelas pessoas. Continuarmos a achar que a diferença entre e imprensa regional, local e a imprensa dita nacional, é meramente por escolha dos editores, do âmbito e da forma como tratam o assunto.

Ou seja, isto está a passar-se em Lisboa, mas eu também quero saber como é que qualquer coisa semelhante se passou em Paris ou em Londres e, portanto, vou dar aos meus leitores não apenas uma visão daquilo que está próximo deles, mas também uma visão mais alargada. Sim, isto é muito útil e interessante, simplesmente o princípio é sempre aquilo que está a passar próximo. E isto é a imprensa regional e local. Depois, os meios, as disponibilidades financeiras, as capacidades de rede que cada jornal tem, podem permitir chamar a atenção dos seus leitores para qualquer coisa que está para além do seu horizonte mais próximo.

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