Seis municípios da região Centro de Portugal fazem parte da Rede das Cidades Criativas da UNESCO, uma iniciativa criada em 2004 com o objetivo de promover a cultura e a criatividade como agentes de transformação urbana.
Integrada nesse hub criativo que reúne 350 cidades em 100 países, a iniciativa apoia a concretização dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, com destaque para o Objetivo 11, dedicado às cidades e comunidades sustentáveis.
Num contexto de desafios globais, como a crise climática e a habitação, a rede de Cidades Criativas do Centro de Portugal pretende ganhar força como motor de transformação social e económica. Longe de ser apenas simbólico, este reconhecimento internacional visa unir municípios em torno da criatividade, como base para um desenvolvimento ordenado e abrangente.
A Rede de Cidades Criativas da UNESCO pretende ser uma plataforma de participação que una poder local e sociedade civil na criação de políticas públicas mais ajustadas às necessidades reais das comunidades. O desafio passa por preservar a autenticidade dos territórios sem ignorar a perspetiva global, conjugando tradição e inovação, o local e o universal.
Existem, porém, novas responsabilidades. Nos últimos anos o sector tem enfrentado mudanças com o surgimento de novos agentes e formas de organização, como por exemplo o modelo “chave na mão” em eventos musicais, que limitam a liberdade de imprensa e criam ambientes pouco transparentes. É essencial um maior envolvimento dos municípios na negociação com estas entidades ao garantir diálogo e transparência. A Rede das Cidades Criativas deve alinhar os objetivos da UNESCO ao promover não só Cidades Sustentáveis, mas também o Trabalho Digno (Objetivo 8). Em causa está o fortalecimento da democracia.
Numa sociedade onde a cultura é, por direito próprio, património de todos, também ela merece ser falada com clareza. Parece haver um certo jargão que se instala. São termos decalcados da linguagem que acompanhou, por exemplo, uma candidatura de financiamento e que depois são usados sem filtro. Seria bom valorizar o fazer artístico sem precisar de o embalar em gírias que mais parecem obstáculos do que pontes.
Não se trata de desmerecer o rigor, muito menos de subestimar quem trabalha neste sector. Pelo contrário: é reconhecer que a cultura ganha força quando se torna compreensível, quando convida todos a participar. E isso podia começar pela forma como dela se fala.
Cada cidade assume a sua responsabilidade ativa no desenvolvimento sustentável e inclusivo, promovendo o envolvimento das instituições regionais e mobilizando os diversos atores e protagonistas de cada território.
As cidades aderentes comprometem-se a partilhar experiências, conhecimentos e boas práticas criativas, contribuindo para um ecossistema cultural dinâmico e colaborativo. Neste sentido, assumem um papel fundamental na fomentação de parcerias estratégicas entre os sectores público e privado, associações locais, organizações culturais, universidades e a sociedade civil em geral, criando redes de cooperação que potenciam a inovação e a criatividade.
Em suma, a rede abrange sete áreas criativas estratégicas: Artesanato e Arte Folclórica onde se valorizam saberes tradicionais e identidades locais; Design, que visa impulsionar soluções inovadoras e sustentáveis; Cinema, ao promover a narrativa audiovisual e a expressão artística; a Gastronomia, que celebra a diversidade culinária como património cultural e motor de desenvolvimento económico; Literatura, no incentivo à leitura, a escrita e a circulação de ideias; Media, onde se exploram novas formas de comunicação e tecnologias digitais; e Música, fortalecendo expressões sonoras e culturais diversas.
Assim, através do intercâmbio constante, do fortalecimento de capacidades locais e do apoio mútuo entre cidades, esta rede torna-se um espaço de inspiração, inovação e transformação, onde a cultura e a criatividade são vistas como pilares essenciais para o desenvolvimento urbano e social.
Portanto, cada cidade assume a sua responsabilidade, o envolvimento das instituições regionais e os atores e protagonistas de cada território. As cidades aderentes comprometem-se a partilhar experiências, conhecimentos e boas práticas criativas, bem como a fomentar parcerias entre sectores público e privado, associações locais, organizações culturais e a sociedade civil.
Idanha-a-Nova
Cidade Criativa da Música: em 2015, Idanha-a-Nova tornou-se a primeira Cidade Criativa da Música, em Portugal. A ruralidade do adufe que acolhe o cosmopolita Boom Festival destaca-se nesta rede internacional bem dentro do seu lugar. A distinção reconhece o forte investimento cultural que desenvolveu infraestruturas, ensino e preservação do património musical, além de promover uma ampla programação anual que vai da música eletrónica a expressões tradicionais. Em 2020, a UNESCO revalidou a participação de Idanha-a-Nova na rede ao elogiar o papel da música na promoção da coesão social, apoio à comunidade criativa e a cooperação internacional. A chancela da UNESCO tem impulsionado a estratégia de desenvolvimento local e a afirmação do concelho como referência global nas indústrias criativas.

Óbidos
A vila integra desde 2015 a Rede de Cidades Criativas da UNESCO na categoria de Cidade Criativa da Literatura, com um conjunto de iniciativas e projetos de tarimba internacional. O “Óbidos Vila Literária”, lançado em 2011, é um desses exemplos. Este projeto visou criar uma rede de livrarias com espaços dedicados a exposições, concertos, conferências e performances. Óbidos destaca-se pela preservação do seu património medieval. Com cerca de dois milhões de visitantes por ano, a vila consolidou-se como um destino turístico, apostando na diversificação cultural. O projeto Vila Literária surgiu como uma resposta à necessidade de regeneração do centro histórico, aliando tradição a uma visão moderna da cultura e do turismo. O Folio teve a sua primeira edição em 2015 e tornou-se num dos principais festivais de referência na área da literatura em Portugal.

Caldas da Rainha
Cidade Criativa do Artesanato e Artes Populares, integra a Rede de Cidades Criativas da UNESCO desde 2019. Desde o século XV que a cerâmica tem um papel central, impulsionada pela necessidade de produzir artigos utilitários para o Hospital Termal — o mais antigo do mundo — e para a população local. No século XIX, com a chegada de Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905), o artista fundou uma fábrica de faianças nas Caldas, onde desenvolveu peças que conjugavam o naturalismo com uma visão caricatural e crítica da sociedade. Assim, a cidade entra no cenário internacional da cerâmica contemporânea. A Escola Superior de Artes e Design do Instituto Politécnico de Leiria, sedeada nas Caldas, desempenha um papel central na formação e investigação nas áreas das artes e da gestão cultural, reforçando o dinamismo criativo local.

Leiria
É Cidade Criativa da Música desde 2019. No século XIII, D. Dinis compôs na região as famosas cantigas de amigo, marcos do cancioneiro galaico-português. Projetos inovadores, com impacto social e educativo, nasceram em Leiria e alcançaram projeção nacional e internacional, como a Ópera na Prisão e os Concertos para Bebés, exemplos de como a música pode promover a dignidade humana e chegar a públicos diversos. Praças, jardins, o rio Lis, ruas e salas de espetáculos são hoje palcos de encontro e expressão artística, onde se multiplicam concertos e festivais ao longo de todo o ano. Entre os eventos mais emblemáticos contam-se o Festival A Porta, o Extramuralhas ou o Música em Leiria. A cidade acolhe com igual relevância bandas pop, rock, filarmónicas centenárias, coros e grupos folclóricos ou música sacra refletindo uma diversidade musical única.

Covilhã
Desde 2021, é a primeira cidade em Portugal a integrar a categoria Cidade Criativa do Design. Conhecida historicamente pela produção de lanifícios e pela sua forte ligação à indústria têxtil, a Covilhã tem reinventado este legado com o design como motor de transformação económica e social. A cidade destaca-se pelo uso criativo do espaço público, pela reabilitação de património industrial e pela aposta em iniciativas como o New Hand Lab e o Museu Nacional dos Lanifícios. A Covilhã investe na formação em design, com uma oferta educativa apoiada pela Universidade da Beira Interior. Além da riqueza cultural e histórica, a cidade oferece paisagens naturais integradas no Estrela Geopark da UNESCO, e promove a sustentabilidade e a valorização ambiental. E recebe eventos culturais, como o Festival WOOL, e tem reforçado a sua posição no turismo nacional.

Castelo Branco
Castelo Branco integra, desde 2023, a Rede das Cidades Criativas da UNESCO na categoria de Artesanato e Artes Populares. O Bordado de Castelo Branco, arte tradicional centenária, conhecido pelas suas cores e pela simbologia dos seus desenhos — como a árvore da vida, pássaros e flores —, foi o elemento central da candidatura. O Centro de Interpretação do Bordado, no edifício da Praça de Camões, é o principal espaço dedicado a esta arte. Além de mostrar o processo criativo, o centro acolhe uma oficina-escola onde mestras bordadoras mantêm viva esta tradição. O Museu Francisco Tavares Proença Júnior, o Museu da Seda e o Museu dos Têxteis (MUTEX) contribuem igualmente para a divulgação do património histórico e artístico local. O Museu Cargaleiro e o Centro de Cultura Contemporânea reforçam a dinâmica cultural da cidade.

350 cidades e 100 países: um novo critério de turismo?
Imagine um globo terrestre onde as conexões entre os lugares não são definidas por linhas políticas, mas por fios invisíveis de criatividade, tradição e inovação. Este é o conceito da Rede de Cidades Criativas da UNESCO – uma constelação mundial de municípios que colocam a cultura e a criatividade no centro das suas identidades e desenvolvimento.
Este pode ser um novo critério antes de escolher a sua próxima viagem. Vá ao site UNESCO Creative Cities Network, clique em The List, e escolha por áreas do seu interesse.
A rede da UNESCO organiza as cidades por especialidades, permitindo a criação de roteiros temáticos envolventes, como explorar apenas capitais da gastronomia ou destinos ligados à música. Se selecionou “gastronomia”, aparece Santa Maria da Feira. A outra cidade gastronómica mais perto é em Burgos, Espanha.
De repente já há um plano, se tiver possibilidade. Está a ver a ideia? Este é só um exemplo, mas é esse o espírito. Aproveite a proximidade geográfica, pois muitas cidades criativas estão próximas umas das outras, e em diferentes categorias. Um mundo de possibilidades. Mesmo estando espalhadas por todo o mundo (350 cidades e 100 países), é na Europa que se encontra o maior número de cidades criativas. Até a geografia ajuda.