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A preto e branco: Ficções da realidade

Poderá o cinema de ficção científica ser usado como ferramenta para compreender o mundo e construir o futuro?

Elsa Rodrigues, professora elsardrgs@gmail.pt

Poderá o cinema de ficção científica ser usado como ferramenta para compreender o mundo e construir o futuro?

Parece-me que sim. Ao longo das últimas décadas o espectador destes filmes viajou para além das fronteiras físicas do tempo e do espaço, através de universos e futuros imaginados, onde encontrou o radicalmente diferente, o não humano nas suas múltiplas formas, com que se estabelecem relações redefinidoras das fronteiras entre orgânico e inorgânico, real e virtual, humano e máquina. Estas ficções traduziram as ansiedades vividas no mundo real, geradas pelo desenvolvimento científico, pelo confronto entre diferenças culturais e étnicas e pela alteração geral das condições de existência e perceção humanas que as novas tecnologias comprimiram e dilataram. Daí que, apesar de serem produzidos e consumidos como entretenimento, como espetáculo de massas, os filmes de ficção científica das últimas décadas tenham despertado inquietações e conduzido a reflexões epistemológicas, ontológicas, existenciais e identitárias que chegaram a todos os públicos, moldaram visões de mundo e permitiram uma espécie de planificação do futuro. E porque o presente real não corresponde ao futuro ideal imaginado, não podemos, no presente, deixar de projetar cenários de futuro. Ainda que seja para evitar os perigos que a ficção científica neles consegue antecipar.

(texto publicado na edição em papel de 20 de abril de 2012)