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Passageiro do tempo: Este país não é para seniores

Os seniores correspondem hoje a um segmento da população com necessidades muito próprias, a um alvo comercial específico, mas também a um grupo muito fragilizado.

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José Manuel Silva, professor/Gestor do ensino superior jmsilva.leiria@gmail.com

Portugal vai envelhecendo a passos rápidos e se lhe juntarmos a baixíssima taxa de natalidade temos o cocktail explosivo que um dia fará implodir o país já que esta peste demográfica vai corroendo o tecido social e tornando a situação insustentável a todos os níveis.

O prolongamento da esperança média de vida gera situações novas e, num prazo relativamente curto, o país passou da fase do cuidar familiar dos idosos para a da institucionalização generalizada dos seniores, designação que ajuda a disfarçar a carga negativa da palavra velho, muitas vezes equivalente a coisa pouco sexy, a cota, a algo desqualificado, ao contrário do que ocorre noutras sociedades onde os “mais velhos” gozam de um estatuto especial em reconhecimento do seu capital de conhecimentos e experiência.

Os seniores correspondem hoje a um segmento da população com necessidades muito próprias, a um alvo comercial específico, mas também a um grupo muito fragilizado socialmente, sujeito a abusos de toda a ordem e cujos elementos correm sérios riscos de atingir a linha final totalmente despersonalizados, como consequência de doenças várias ou como resultado da forma como são cuidados.

O internamento generalizado em lares, corresponde muitas vezes a uma espécie de punição injustíssima por ditar que uma pessoa seja arrancada da sua casa, separada dos seus pertences, dos seus animais de estimação, dos seus vizinhos, no fundo do que dava significado à sua vida, para ser internada num espaço que lhe é estranho, tratada por pessoas que não lhe são nada, partilhando quarto, wc e quotidiano com gente desconhecida que em comum apenas partilha o mesmo destino.

A institucionalização, que devia ser a última alternativa, tornou-se a primeira escolha, fruto das condicionantes da vida atual, do comodismo familiar, da ausência de políticas arrojadas, da falta de consciência generalizada de que os seniores não podem ser deixados simplesmente à sua sorte.

Ao contrário do que tem feito escola, é urgente inverter as políticas de apoio aos seniores, é necessário montar redes sociais eficazes que tornem sustentável mantê-los no seio das famílias, nas residências próprias, em residências assistidas, reforçar os centros de dia, as oportunidades de socialização, de estudo, de diversão e recorrer apenas ao internamento em lares como último recurso. A despersonalização é uma fronteira que não deve ser cruzada.

(texto publicado na edição de 27 de março de 2014)