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Teatro

S.A. Marionetas celebra inscrição do Dom Roberto no Inventário do Património Cultural Imaterial

Companhia de Alcobaça é uma das estruturas mais ativas no desenvolvimento e divulgação deste teatro tradicional português. Para outubro está prometida uma celebração especial.

A partir de Alcobaça para o mundo, o nonecreiro, construtor e investigador José Gil é um dos grandes entusiastas do Teatro Dom Roberto em Portugal Foto: S.A. Marionetas

Bonecreiros de todo o país rejubilam: depois de longa luta, o Teatro Dom Roberto conseguiu, ao fim de uma década, fazer parte do Inventário do Património Cultural Imaterial, segundo anúncio publicado em Diário da República na sexta-feira. O momento é particularmente celebrado em Alcobaça, onde a companhia S.A. Marionetas tem defendido com paixão e entusiasmo esta arte, cujas origens em Portugal remontam ao século XVII.

“É uma luta antiga, foi um processo demorado mas conseguimos, finalmente. Mais feliz não podia estar”, disse José Gil, da S.A. Marionetas ao REGIÃO DE LEIRIA.

Tudo começou há dez anos, com Maria José Machado, antiga diretora do Museu da Marioneta de Lisboa, recorda o bonecreiro de Alcobaça. “Infelizmente ela faleceu no início da pandemia e não assistiu a isto”. Nem ela nem João Paulo Seara Cardoso, fundador do Teatro de Marionetas do Porto, que também já morreu, mas que foi igualmente “um dos grandes impulsionadores do Teatro Dom Roberto no final dos anos 80, início de 90”, indo “buscar “aos mestres antigos o saber e depois retransmitindo-o”. Ambos, com José Gil e outros bonecreiros, iniciaram um trajeto há dez anos para o Teatro Dom Roberto ser reconhecido, o que acontece agora.

Mas o que significa para esta forma de teatro de marionetas, que originalmente percorria feiras e romarias, a inscrição no Inventário do Património Cultural Imaterial? “É o reconhecimento pelo país de uma arte tradicional popular”, orgulha-se o responsável da S.A. Marionetas, admitindo que “é muito gratificante”:

“É como se fosse um selo de reconhecimento do teu país, pela arte que fazes. Para mim e para a S.A. Marionetas tem um gosto especial, porque fui um dos propiciadores para que a coisa acontecesse”, diz, recordando que o primeiro encontro que houve em Portugal de Teatro Dom Roberto foi em Alcobaça. em 1999.

Além disso, José Gil é autor de uma tese sobre este teatro tradicional, a propósito de “O Saloio de Alcobaça e os novos Palheta”, preparando um doutoramento sobre a matéria, também na Universidade de Évora. “Estou a encontrar uma matriz referencial que identifique este teatro”, avança. 

Interpretado atrás da barraca, com fantoches de luva, feitos de madeira e tecido, este teatro esconde mais desafios do que parece. “Não é qualquer pessoa que consegue fazer, pela dificuldade de falar com a palheta – para distorcer a voz – e exigir esforço físico elevado”.

Por isso, há poucos executantes, apesar do crescimento em Portugal nos últimos anos. “Nos últimos 10, 15 anos houve um aumento muito grande. Nos anos 80 éramos quatro, agora somos 13 e já há duas mulheres que fazem e estamos espalhados de norte a sul do país, e também nos Açores. É das poucas artes a nível da Europa no teatro tradicional que teve um crescimento exponencial nos últimos anos”. 

Passado o risco de extinção, o Teatro Dom Roberto tem viajado pelo mundo e conquistou já vários prémios para Portugal – e alguns deles moram em Alcobaça.

“É um final muito feliz, e também o princípio de algo que pode ser ainda mais feliz. Muita coisa pode acontecer a partir de agora”, admite José Gil, esperando que a inscrição se reflita tanto a nível de programadores como de investigadores. “Vão por certo despertar para este tipo de teatro”. 

Em Alcobaça pensa-se já, ainda com mais entusiasmo, no próximo festival Marionetas na Cidade, a realizar em outubro. “Vamos fazer uma comemoração mais afincada, aliás, como já fizemos várias vezes. Mas desta vez será uma celebração especial”, promete.

Segundo notícia da Lusa, a inscrição do Teatro Dom Roberto, “teatro itinerante de marionetas”, no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial é justificada pela Direção Geral do Património Cultural (DGPC) em Diário da República pela “importância da manifestação do património cultural imaterial enquanto reflexo da identidade do grupo em que esta tradição se originou e se pratica, traduzida em práticas transmitidas intergeracionalmente, com recurso privilegiado à oralidade e à observação e participação direta”.

“O Teatro Dom Roberto é um tipo de teatro itinerante de marionetas que pode ser feito em qualquer local e em qualquer data, mas que tradicionalmente se realiza na primavera, verão e inícios do outono nas praias, jardins, praças e em associação com as feiras. Os espetáculos são feitos numa guarita ou barraca, estrutura de pano onde, no interior, o bonecreiro manipula e dá voz às marionetas de luva”, refere a página do inventário nacional.

A partir do começo do espetáculo, “as marionetas de luva vão aparecendo na zona superior da estrutura, interagindo ora entre si, ora com o público”.

“A interação com a assistência, feita através de perguntas diretas ao público ou incentivando a gargalhada, é um dos elementos que mais reconhecimento traz ao teatro de robertos. Muitas vezes o bonecreiro conjuga numa mesma sessão várias peças, uma vez que, por norma, cada uma delas não dura mais do que 10 minutos. No intervalo pode haver interação com a audiência, o que também é comum ser feito no fim das sessões, quando o bonecreiro sai da barraca para agradecer os aplausos do público”, acrescenta.

A inventariação do património cultural imaterial é única forma de proteção legal destas práticas, visto que não estão abrangidas pelos três níveis de classificação (“nacional”, “público” e “municipal”), como recorda a página da DGPC.

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