Assinar

Crónicas do quinto império: A linha de passe

Os anos 20 do séc. XX mos­traram-nos que os sistemas autoritários se impuseram porque em grande medida os sistemas democráticos foram ineficazes na resposta às crises.

Joaquim Ruivo, professor jruivo2@sapo.pt

Os anos 20 do séc. XX mos­traram-nos que os sistemas autoritários se impuseram porque em grande medida os sistemas democráticos foram ineficazes na resposta às crises.

Ora, se o fundamento da democracia reside no sufrágio, porque através dele escolhemos os nossos representantes que em nosso nome fazem as leis no Parlamento e escolhem os governos, não admira que seja o Parlamento o baluarte da democracia e que a sua fraqueza seja a fraqueza do sistema democrático.

Foi também essa fraqueza e ineficácia que se verificou em Itália, Alemanha e Portugal nos anos 20. Estou a simplificar, é certo, mas a ineficácia dos sistemas democráticos abriu as portas à ascensão dos fascismos e nazismo.

Os sistemas totalitários dos anos 20 foram anti-parlamentares. Por natureza, mas também porque demagogicamente sempre encontraram nos parlamentos e no modo como funcionavam argumentos fortes que justificavam críticas contundentes e que colheram a adesão popular. Basta ver o que foram os 16 anos da 1ª República em Portugal para compreendermos como grande parte da população ansiava por ordem e autoridade e culpava o parlamento – com alguma razão – pela instabilidade que se vivia.

O enfraquecimento da democracia começa por um incómodo generalizado, por uma insatisfação permanente, pela consciência de que se vive pior e se empobreceu. Pela consciência que a democracia permite compadrios e corrupção, pela crítica – muitas vezes injusta – que os “políticos” não fazem nada e vivem bem, que o Parlamento só discute e não resolve, que a justiça não funciona, que os burlões não são julgados e se passeiam impunemente. Depois continua pela ideia – talvez também extemporânea – que é a “garotada” sem experiência de vida que nos governa. “Garotada” no Parlamento, “garotada” nos departamentos ministeriais, “garotada” nas empresas público-privadas, “garotada” nas estruturas partidárias.

Pior que tudo: generaliza-se esse sentimento preocupante de indiferença cívica que afasta os cidadãos da política. Generaliza-se a crítica – quantas vezes injusta – que os partidos e os seus dirigentes são todos iguais, que só querem o poder e que utilizam descaradamente a mentira e a demagogia para o atingir.

O verdadeiro perigo está quando começamos a pactuar com este “torpor” crítico. Quando, quase sem darmos por isso, começamos – irresponsavelmente, é certo – a deixar de ter vontade de defender a democracia.

(texto publicado a 9 de novembro de 2012)