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Elogio da cidade: As minhas cidades

A multiplicação dos laços de pertença não é pois apenas o resultado de oportunidades novas mas de uma mudança social e tecnológica.

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João B. Serra, Professor do Instituto Politécnico de Leiria serra.jb@gmail.com

É na véspera de eleições autárquicas que o sentimento da insuficiência de um voto mais se acentua. O direito de que disponho fica muito aquém do que a cidadania torna desejável.

De facto a condição de cidadão assenta hoje numa experiência de multipertença. O que vale para os grupos culturais que se cruzam nas cidades, com distintas origens, expectativas e trajetos de vida, vale para os indivíduos. A mobilidade e as novas tecnologias mudaram a identificação dos cidadãos na sua relação com os territórios.

A primeira operou uma dissociação entre local de residência e local de trabalho. As segundas dotaram cada cidadão de conectores que permitem estabelecer articulações em tempo real com destinos distantes.

A multiplicação dos laços de pertença não é pois apenas o resultado de oportunidades novas mas de uma mudança social e tecnológica. É certo que cada um dos laços de que dispomos é porventura menos forte do que aqueles que teciam os nossos antepassados, mas em contrapartida são em muito maior número, distribuem-se por um espaço mais amplo e são mais diversificados.

Temos amigos em diversos pontos do mapa, vivemos aqui e ali, trabalhamos em dois ou três sítios, percorremos distâncias de dezenas de quilómetros para ir ao teatro, ao restaurante, às compras, estabelecemos relações em simultâneo por internet ou sms com diferentes temas e pontos. A distância mede-se em tempo de percurso. O sistema viário e de comunicações encurtou o espaço entre cidades e forjou para elas novas redes.

Na minha perceção das coisas, há uma cidade polinucleada, cujos limites geográficos perderam distinção, que substitui a constelação de cidades separadas de outrora. Sinto que o destino de cada uma destas parcelas da minha vida profissional e de relação que vai a votos me importa. Deveria poder votar em todas elas.

Voto em Lisboa desde que o 25 de Abril me ofereceu a condição de eleitor e elegível. Mas deveria ter votos em Guimarães, nas Caldas, em Peniche e no Porto. Explicarei porquê proximamente.

(texto publicado na edição de 17 de outubro de 2013)