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Margem esquerda: Os vampiros

No céu cinzento, sob o astro mudo, batendo as asas pela noite calada, vêm em bandos, com pés de veludo, chupar o sangue fresco da manada.

Adérito Araújo, professor universitário aderito.araujo@gmail.com

No céu cinzento, sob o astro mudo, batendo as asas pela noite calada, vêm em bandos, com pés de veludo, chupar o sangue fresco da manada.

E a manada? A manada deleita-se em Rock in Rios, Fátimas e futebóis. Numa semana onde, por fim, se tornou unânime o reconhecimento do escândalo que tem sido o negócio das PPP, nós, cordeirinhos mansos, em vez da revolta e da indignação preferimos continuar a franquear a porta aos vampiros que nos devoram. E a rir, quais vaquinhas açorianas, lá vamos hipotecando as nossas vidas na ilusão de com eles partilharmos a dança da ronda no pinhal do rei.

Somos um país católico. Paradoxalmente, o gastar à tripa-forra e o viver de empréstimos é uma atitude muito católica. Os protestantes, não podendo ostentar riquezas, são mais dados ao aforro e a investimentos em bens de lucro. Além disso, como mantivemos o sacramento da confissão privada com concessão de perdão (os protestantes também, mas pública e sem concessão de perdão), fomentámos a desvalorização das leis, pois sabíamos que tudo nos seria perdoado.

O nosso mal é o de sistematicamente perdoar todo o tipo de pecados políticos. Numa sociedade, ainda que católica, menos submissa, não haveria pai-nossos nem ave-marias que valessem a este coio de indigentes e de indignos, a esta resma de charlatães e de vendidos que impunemente nos tem sugado a vida.

(texto publicado na edição em papel de 8 de junho de 2012)