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SOS Ucrânia

Ucrânia: “Ainda estão vivos, mas não sabemos o que pode acontecer amanhã”

As palavras são de Serhiy Humenyuk, cidadão ucraniano residente em Leiria, e referem-se aos seus familiares que vivem na Ucrânia. A preocupação é constante, numa altura em que a região se mobiliza para apoiar o povo ucraniano.

Serhiy Humenyuk e a família na vigília pela paz em Leiria Joaquim Dâmaso

O relógio ainda não marcava as 20 horas e eram já muitos os que ocupavam a praça Rodrigues Lobo, em Leiria, no último domingo, erguendo velas e bandeiras da Ucrânia. Rapidamente o espaço foi tomado por apelos à paz e demonstrações de solidariedade para com o povo ucraniano. Ouviram-se orações e o hino daquele país do leste europeu.

Entre a multidão, uma jovem cobre os ombros com uma bandeira azul e amarela e chora, encostada ao pai. A mãe, o irmão mais novo e amigos também os acompanham. São ucranianos e vivem em Leiria desde 2001.

Serhiy Humenyuk, o pai, é motorista internacional e estava em viagem quando, na quinta-feira, dia 24, soube da primeira investida da Rússia contra a Ucrânia. “Fiquei muito preocupado e tive dificuldades em chegar a casa porque estive sempre a pensar no que se estava a passar”, conta ao REGIÃO DE LEIRIA.

Por lá, vivem os pais, o irmão e os sobrinhos de Serhiy, com quem tem conseguido falar através de aplicações para telemóvel. Mas nem por isso a preocupação se aquieta: “ainda estão vivos, mas não sabemos o que pode acontecer amanhã”, sublinha, visivelmente emocionado.

Enquanto vê o seu país natal defender o território, a família tem ajudado com a compra de alguns bens essenciais para enviar para a Ucrânia e tem feito disso a motivação para ultrapassar cada dia. Para Serhiy, continuar a trabalhar é essencial para poder enviar estes contributos para o país. “Nós não estamos lá com eles, mas podemos ajudar com qualquer coisa daqui”, afirma.

Como esta, muitas famílias estiveram reunidas em Leiria na noite de domingo, dia 27, e chegaram às centenas as pessoas que, iluminadas por velas, rezaram por quem está na linha da frente da guerra. Uma bandeira gigante com as cores ucranianas destacava-se entre a mancha humana, bem como cartazes com apelos ucraniano e alguns em inglês, como “Stop War” (parem a guerra), “Stop Putin” (parem Putin) ou “Save Ukraine” (salvem a Ucrânia).

Inferno e pesadelo são as palavras utilizadas pela porta-voz da comunidade ucraniana na região de Leiria para descrever os últimos dias. Yuliya Hryhoryeva explica que “a preocupação é sobretudo para com os familiares que lá ficaram e também pela Ucrânia, porque ninguém quer ver o país destruído”. Ao REGIÃO DE LEIRIA avança que há cidadãos ucranianos que viviam em Leiria e estão a regressar ao seu país para combater ou ir buscar refugiados, família e não só.

Para a responsável, momentos como o vivido na praça central de Leiria são importantes porque “dão força, apoio e conforto para sentirem que não estão sozinhos, esquecidos ou abandonados”.

Momentos antes, na sua intervenção na cerimónia, agradeceu “todo o apoio e gigante onda de solidariedade por parte dos portugueses”, em particular do município de Leiria e da sua equipa. Yuliya esclareceu que “a posição do povo ucraniano é clara e firme. “Nós queremos viver num país democrático e livre e vamos lutar pelos direitos humanos e liberdades”.

E dirigiu-se ainda a “todos os cidadãos russos e bielorrussos”: “Chegou o tempo de se levantarem e de lutarem contra o Governo obsessivo dos vossos países. Essa guerra não é vossa e não vai trazer nada de bom para nenhum dos lados”.

Municípios criam apoios

Pouco depois das notícias que marcaram o início da guerra, vários municípios da região de Leiria manifestaram solidariedade para com a Ucrânia e anunciaram as primeiras medidas de apoio.

Cerca de duas centenas de cidadãos ucranianos reuniram, na sexta-feira, dia 25, com o executivo do Município de Leiria. No salão nobre do edifício dos Paços do Concelho, o presidente da Câmara, Gonçalo Lopes, disse que o município está disponível para receber refugiados ucranianos, familiares e amigos de imigrantes que residam na região, e que pretendam reencontrar-se com os seus familiares.

O autarca anunciou a criação de um Gabinete de Crise, que vai desenvolver um pacote de medidas de apoio humanitário, com dois patamares de ajuda, um dirigido às famílias residentes em Leiria e outro a famílias refugiadas caso se venha a verificar essa necessidade. Nessa noite, ficou ainda marcada uma manifestação para sábado, dia 5, no largo do Papa, a partir das 20 horas.

Na vigília do último domingo, Gonçalo Lopes sublinhou que, além do executivo leiriense, também empresas, associações e escolas estão a ser mobilizadas para apoiar a causa. No caso de ser necessário acolher refugiados, o presidente da Câmara garantiu “tudo fazer para que tenham boas condições em Leiria, nas áreas da habitação, saúde, educação e no acesso ao trabalho”.

Gonçalo Lopes, que falou ladeado pelos vereadores do executivo leiriense, apelou à comunidade leiriense para que se juntasse ao povo ucraniano. “A voz de todos nós conta, só podemos criar uma onda global de protesto e condenação à invasão russa se esse grito partir de cada um de nós”, sublinhou.

Também no domingo, decorreu na Marinha Grande um encontro de solidariedade, em que foi anunciada a criação de medidas de apoio à comunidade ucraniana residente no concelho.

No encontro, que decorreu na praça Guilherme Stephens, o presidente da Câmara, Aurélio Ferreira, confessou a “profunda tristeza” pela situação que se vive na Ucrânia e afirmou que o município “tem estado em contacto com os ucranianos residentes no concelho, estando a dar todo o suporte” a estes cidadãos.

A Batalha foi outro município que se juntou à causa, numa iniciativa na tarde de domingo, que “contou com a participação de dezenas de pessoas”, explica a autarquia. O presidente da Câmara, Raul Castro, expressou “total solidariedade para com a comunidade ucraniana residente no concelho”.

A Assembleia Municipal deste município também se manifestou, ao aprovar, por unanimidade, uma moção de solidariedade. O documento repudia “a invasão da Ucrânia pelo exército russo, sem qualquer justificação e ao arrepio do direito e das convenções internacionais”.

Além destas ações de solidariedade, foram diversas as campanhas de recolha de bens essenciais lançadas por municípios e outras entidades (ver texto ao lado). Talvez isso prove o porquê de, na vigília em Leiria, se terem ouvido repetidamente as palavras “Obrigada Portugal, obrigada Portugal!”.

O apelo de Fátima

“Ontem [dia 25] de manhã, ligou a minha mãe. Ela chorava e gritava: guerra, guerra. A Rússia invadiu o nosso país e independência, bombardeando as nossas cidades do ar”. Este é o relato emocionado de Tetyana Olshevska sobre o sofrimento ucraniano dos residentes em Fátima, enquanto acompanham à distância o conflito no seu país natal.

“Nós vivemos em Portugal, onde há paz, mas o nosso coração está a gritar. A gente chora e reza pela nossa terra, pátria, que está sempre no nosso coração”. E à voz embargada, percebeu-se também que outras ucranianas presentes na cerimónia pela paz, enxaguavam as lágrimas.

Mais de um milhar de crianças e jovens do Centro de Estudos de Fátima apelaram ao fim da guerra Foto: CEF

A iniciativa do Centro de Estudos de Fátima (CEF), no passado dia 25, foi a de enviar um sinal ao mundo: “Nada justifica o sofrimento de um povo, o sofrimento das famílias ucranianas, das crianças, dos homens e mulheres, que, com ansiedade veem o futuro posto em causa”, sublinhava o diretor do estabelecimento de ensino.

“É por eles, pelo povo que aqui estamos. Comungamos a sua dor, e sofrimento. E apenas com eles que estamos solidários”, frisou.

Ao segundo dia de guerra, mais de um milhar de crianças e jovens alunos, a partir de Fátima, manifestaram pela largada de pombas brancas, pelas mensagens que deixaram o mundo em diversas línguas que “é importante crescer juntos porque nós somos a semente da esperança e da paz”.

Com LO

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