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Olhares: Falar da vida

O papa João Paulo II falava de uma “cultura de morte” que nos rodeia.

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David Barreirinhas, pároco de Formigais, Ribeira do Fárrio e Rio de Couros padrebarreirinhas@gmail.com

O papa João Paulo II falava de uma “cultura de morte” que nos rodeia. É-nos mais fácil falar da morte do que da vida. Porque da morte fazemos experiência quotidiana: as notícias de catástrofes ou de desastres; os amigos e familiares que morrem e deixam o nosso convívio; os atentados à vida que se tornaram para muitos algo de que nem vale a pena falar, ainda que os condenem – vivemos com a morte, habituamo-nos a ela. Falar da vida é mais difícil. Não só porque a vida é o ponto de partida, a realidade comum a todos, como, sobretudo, porque falar dela exige que tomemos uma posição. Falar da vida exige a quem o faz que diga o que significa viver, e que se comprometa com esse significado: podemos ir vivendo, sem sentido, à espera que os nossos dias acabem; podemos ir vivendo na procura de que o nosso nome permaneça para sempre na memória dos que vierem a seguir (e basta vermos como, alguns anos depois, caem no esquecimento os nomes e os feitos dos grandes, mesmo dos que vêm nos livros de história); podemos viver procurando transformar o mundo para o deixarmos um pouco melhor que aquilo que o encontrámos, e pensar que, ainda que no anonimato, fizemos história. Mas tudo isso é apenas o “esbracejar humano” à procura de um sentido. Sabe sempre a pouco, mas vale a pena.

Escrito de acordo com a antiga ortografia

(texto publicado na edição de 17 de abril de 2014)