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Pedro Melo Biscaia

Professor

Abertura do ano letivo

Caberá às famílias a sensibilização para a situação e sobretudo aos próprios estudantes terem comportamentos cívicos de grande rigor no cumprimento das recomendações.

No contexto de incerteza e natural receio, o início do ano letivo levanta questões que todos devemos ter consciência. Ou seja, a adequada preparação do regresso às aulas é uma incumbência que não diz respeito, apenas, às escolas. Se não vale a pena enveredar pelo alarmismo que nada acrescenta à solução ou, no mínimo, à atenuação dos impactos sanitários que se adivinham, também não é racional esconder a realidade ou tentar “tapar o sol com a peneira”. O que se sabe é que não foi entregue às escolas nem a verba nem os meios necessários à prevenção e que a larga flexibilização das recomendações é uma desculpa para a incapacidade de uma ação consistente, articulada e generalizada. Por exemplo, terá sido afirmado numa reunião com diretores, por um alto responsável da Administração central que, se não havia verba para aquisição de placas acrílicas de separação e proteção para serem colocadas nas mesas duplas das salas de aula, então que se colassem fitas de delimitação do espaço de cada aluno. Todos percebem que é uma medida sem sentido. Recomenda-se, por exemplo, que cada turma tenha uma única sala atribuída, quando em escolas sobrelotadas é inexequível a aplicação deste procedimento. Sugere-se que as refeições sejam servidas em regime de take way, mas ninguém sabe onde os utentes podem comer em segurança. Aposta-se na desinfeção permanente de espaços escolares, mas o número de assistentes operacionais é quase o mesmo que existia no ano letivo passado, inviabilizando que tal aconteça. As regras previstas ao funcionamento das aulas de Educação Física são um conjunto irrealista de intenções quanto à manipulação segura de equipamentos e objetos na prática desportiva. Ou seja, em síntese, vamos esperar que as coisas, em ambiente escolar, possam correr sem problemas de maior, talvez com intervenção divina…

Mas, além da vida nas instalações escolares, há a questão dos transportes públicos e da origem disseminada no território de muitos alunos. Não há garantias de distanciamento físico nas viagens, não haverá (ao que se sabe) reforço de autocarros, os abrigos de passageiros são exíguos sabendo-se que, em cada dia, há centenas de alunos que necessitam absolutamente deste meio de transporte, que serão sujeitos a um risco acrescido. Caberá às famílias a sensibilização para a situação e sobretudo aos próprios estudantes terem comportamentos cívicos de grande rigor no cumprimento das recomendações.

As autoridades de Saúde Pública ter-se-ão de desdobrar em ações de acompanhamento e controlo que, todos desejamos, sejam acomodáveis com as solicitações e aos recursos disponíveis. Às forças de segurança caberá vigiar as imediações das escolas numa postura persuasiva e desincentivadora de ajuntamentos e do relaxamento no uso de equipamentos de proteção individual. Terão meios suficientes para esta missão ?

Das autarquias espera-se uma ação vigilante e de colaboração com as escolas e famílias, para superar algumas dificuldades, encontrar soluções alternativas, disponibilizar apoios práticos, com monitorização apertada. Há razões para duvidar.

Por tudo isto, as perspetivas não são as melhores do que virá a acontecer nas próximas semanas. Os indícios já estão aí à vista de todos e, enquanto durar a pandemia, haverá que adaptar as nossas vidas aos condicionalismos, com realismo e transparência. Todos temos uma parte de responsabilidade.

(Artigo publicado na edição de 17 de setembro de 2020 do REGIÃO DE LEIRIA)