Assinar

reXistência: Pelo sonho é que vamos…

Com o Miguel, eu aprendi sobretudo que não há impossíveis, que o importante é não desistir nunca.

Cláudia Oliveira, jurista, assessora no Parlamento Europeu rexistencia.co@gmail.com

A última vez que escrevi para este espaço, cada caracter parecia demorar uma eternidade em contraste com a velocidade do tempo que passava. O pensamento estava longe, tão longe. Aguardava notícias de um amigo. E o pensamento não obedecia à razão, teimava em fugir para longe. O tempo continuou a correr veloz, trazendo a cada momento uma tristeza à qual se sucederia outra maior, e outra, e outra até à final – a mais triste de todas. Seguiram-se duas semanas intensas, de cerimónias, homenagens, minutos de silêncio, que perpetuavam a tristeza, entrecortadas por momentos de partilha de memórias e recordações que nos faziam oscilar entre as lágrimas e o riso.

Durante esses dias, a mensagem que mais terei ouvido foi a de que “a vida continua”. Uma espécie de incentivo para seguirmos em frente, como se alguém tivesse dúvidas sobre essa continuidade, ou como se alguém quisesse ficar estagnado num momento de dor ou de tristeza. Claro que a vida continua. A vida continuou no segundo imediato e em todos os que se lhe seguiram. É inevitável. A questão não é a vida continuar, mas o que muda nessa continuidade. Há perdas que são irreparáveis, que nos deixam órfãos de futuras referências, sejam elas ideias, palavras, gestos ou sorrisos. É verdade que ficamos com o património das referências passadas, com as lições que aprendemos e com as memórias dos bons momentos, mas também das discussões. Mas há uma quebra, um vazio irreparável. E, obviamente, durante uns tempos não saberei o que fazer desse espaço.

Nos últimos dias li e ouvi muitos testemunhos sobre um Homem, como referiu o deputado Alain Lamassoure (presidente da Comissão de Orçamentos), naquele que foi um dos momentos mais tocantes. Transversal a todos eles: o imenso sentimento de perda. Comum a todos eles: o elogio à forma como construía pontes entre as pessoas. Inquestionável para todos eles: a forma como tocou as nossas vidas.

Cada um sente e sentirá a perda à sua maneira. Cada um guardará as suas próprias memórias e retirará delas os ensinamentos que quiser. Eu guardarei sempre a ideia da tenacidade no combate, mesmo quando à partida já sabia que o desfecho não lhe seria favorável, e a memória daquele sorriso enorme presente também no olhar.

Com o Miguel, eu aprendi sobretudo que não há impossíveis, que o importante é não desistir nunca, não baixar os braços, lutar até ao final por aquilo em que acreditamos e que, tal como diz o poema: “pelo sonho é que vamos”.

Obrigada Miguel Portas!

(texto publicado na edição em papel de 18 de maio de 2012)