Assinar

reXistência: Ser ou não ser

A ideia da taxa Tobin é tributar com uma pequena taxa (0,1%) todas as transações financeiras internacionais de modo a combater e reduzir a especulação financeira.

Cláudia Oliveira, jurista, assessora no Parlamento Europeu rexistencia.co@gmail.com

“Ser ou não ser, eis a questão” – assim começa o solilóquio que Shakespeare redigiu para Hamlet, que nos confronta com uma intrigante e pertinente dúvida existencial. Inicialmente, lembrei-me deste texto não por uma questão filosófica pertinente, mas porque planeava escrever sobre a recente aprovação, pelo Parlamento Europeu, de um sistema comum de taxação das transações financeiras, também conhecido como taxa Tobin, por ter sido proposto por James Tobin, em 1972. O trocadilho fácil entre o original (to be or not to be) e o “tobin or not tobin” surgiu de modo quase automático, no entanto, o ponto de partida merecia uma reflexão mais séria que um mero jogo de palavras.

A ideia da taxa Tobin é tributar com uma pequena taxa (0,1%) todas as transações financeiras internacionais de modo a combater e reduzir a especulação financeira e reverter as receitas para o desenvolvimento dos países do terceiro mundo, contribuindo para eliminar as desigualdades.

É uma ideia simples, é um valor quase insignificante face aos montantes transacionados e, contudo, foram necessários 40 anos e uma crise económica e financeira que ameaça comprometer o Euro e a estabilidade da União Europeia, para que fosse tomada alguma medida no sentido da sua aprovação.

É então que volta a questão do “tobin ou não tobin”, porque, na verdade, o que se aprovou foi apenas a ideia da tributação, pois as receitas reverterão para os orçamentos europeu e nacionais. Contudo, mantém-se o objetivo de mitigar a especulação financeira e de responsabilizar os mercados. É inegável que com esta taxa se dá um claro sinal aos mercados financeiros, que não são intocáveis, também eles têm de pagar a crise que criaram.

Aprovada a Resolução do Parlamento Europeu, falta agora a decisão do Conselho Europeu, e aqui surge novamente a questão do ser ou não ser. O Conselho Europeu são os governos dos Estados Membros. Não é uma entidade abstrata qualquer, a quem muitas vezes convém chamar tão somente Bruxelas, porque não se querem assumir responsabilidades das decisões tomadas e nas quais se participou. É como um jantar coletivo onde quem cozinhou se senta à mesa e perante uma opinião mais elogiosa dos convivas não hesita em reclamar a autoria do prato, mas se a comida não agradar ou for mesmo intragável diz que foi a cozinha.

Entre o ser ou não ser a que o Governo português nos foi habituando, esperemos que desta vez opte por um ser efetivo e contribua para que também os mercados paguem a crise.

(texto publicado na edição em papel de 8 de junho de 2012)