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Tempo incerto: E agora a TAP!

Portugal, ao longo da sua História, enfrentou diversos períodos de dependência.

José Vitorino Guerra
José Vitorino Guerra

Portugal, ao longo da sua História, enfrentou diversos períodos de dependência. Nos momentos difíceis, a manutenção de uma margem mínima de soberania foi paga, quase sempre, a um preço elevado, em dinheiro, tratados ruinosos e sangue, face ao estrangeiro ou ao ocupante. Aconteceu assim na Restauração da Independência, em 1640, no período das Invasões Francesas e ao longo do conturbado século XIX, em que se afirmaram os princípios liberais e constitucionais.

A elite dirigente abdicou, frequentemente, da defesa do interesse nacional para proteger os seus interesses egoístas, o que conduziu à perda da independência em 1580, a troco da prata espanhola e das sinecuras prometidas pelo primeiro dos Filipes.

Camões verberou os males do reino e exaltou a gesta de um povo que desvendara os mistérios do oceano e navegara para além da fronteira onde o imaginário se confundia com o real. Mas não se esqueceu de recordar que “nenhum ambicioso que quisesse/subir a grandes cargos cantarei/Só por poder com torpes exercícios /Usar mais largamente de seus próprios vícios”. E afirma que “aqueles que devem à pobreza/Amor divino e ao povo caridade/Amam somente mandos e riqueza/Simulando Justiça e integridade”.

“Os Lusíadas” criticam as elites que abdicam do orgulho pátrio, como se houvesse, de acordo com António José Saraiva, uma “falta de confiança nas próprias raízes”.

O poeta expressa um sentimento nacional que parece esquecido pela sociedade e pelos que têm a obrigação de gerir o poder. A ordem, hoje, é para vender o que resta e empobrecer os que cá ficam!

Não deixa de surpreender a leveza inerente à entrega ao capital estrangeiro de sectores estratégicos nacionais e de factores da identidade colectiva. Agora vai ser a TAP, um dos símbolos da economia portuguesa e uma empresa determinante para o crescimento económico, a afirmação de Portugal no mundo e a prestação de um serviço público à coesão nacional.

Numa altura em que se aguarda a promulgação do diploma para privatizar a TAP, recordemos as recentes declarações do Presidente da República no Dubai: “Portugal terminou um importante processo de privatização. Mas há ainda mais activos que irão aparecer com o tempo, como as linhas aéreas portuguesas.”

Escrito de acordo com a antiga ortografia

(texto publicado na edição de 4 de dezembro de 2014)