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Tempo incerto: Encurralados

A actual União Europeia tem pouco a ver com a Europa saída do Tratado de Roma de 1957 e com o espírito que presidiu à sua fundação.

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José Vitorino Guerra

A actual União Europeia tem pouco a ver com a Europa saída do Tratado de Roma de 1957 e com o espírito que presidiu à sua fundação. Pretendia-se, então, criar um espaço de esperança, solidariedade e desenvolvimento que fizesse reconciliar a Europa consigo própria, após a 2ª Guerra Mundial, através da construção de uma “casa comum”.

Tem, também, pouco a ver com a CEE a que aderimos em 1985, na esperança de encontrar um ancoradouro que funcionasse como um seguro de vida para a democracia política e garantisse o desenvolvimento económico a um País que sempre procurou refúgio algures no mundo.

A adesão à CEE, à UE e ao Euro partia da crença de que os outros nos ajudariam a superar o atraso estrutural e podíamos abdicar dos interesses nacionais em prol de um apoio que nunca faltaria. Num Portugal de elites frágeis, a Europa era o regresso a um novo destino a que tínhamos virado costas com os Descobrimentos. Um destino que daria segurança ao imaginário colectivo e traria a paz e uma prosperidade sem fim.

Aderimos ao Euro sem medir a totalidade das consequências e abdicámos de instrumentos monetários e de intervenção económica, fiscal e cambial. O Euro foi dramático para muitos sectores industriais e não evitou o agravamento dos défices comerciais, o aumento da dívida externa e do desemprego.

As imposições da Troika foram o início de um despertar abrupto e cruel para uma economia frágil e uma comunidade que nunca viu a elite dirigente promover um debate político sério sobre as consequências das decisões da integração e referendar qualquer um dos tratados a que foi aderindo.

A campanha eleitoral para as eleições do próximo dia 25 de Maio tem sido demasiado pobre e centrada nas questões internas, das quais todos os partidos procuram colher dividendos.

Ninguém nos diz, infelizmente, como se vai conciliar a recuperação económica e social, o combate ao desemprego, à pobreza e reanimar um sentimento de esperança no futuro, com o Pacto Orçamental, os montantes da dívida pública e da privada, o neoliberalismo selvagem e o “ajustamento” propiciador da “desvalorização interna”, numa Europa em crise de identidade e em crescente perda de influência à escala global.

(texto publicado na edição de 22 de maio de 2014)

Escrito de acordo com a antiga ortografia