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Sociedade

Comandante da PSP duvida da solução de horário para o centro de Leiria

O Comandante da PSP de Leiria acredita que a situação do centro histórico está a ser empolada. Rui Conde garante que a criminalidade diminuiu e refuta as acusações de falta de policiamento.

O Comandante da PSP de Leiria acredita que a situação do centro histórico está a ser empolada. Rui Conde garante que a criminalidade diminuiu e refuta as acusações de falta de policiamento.

Rui Conde, comandante da PSP Leiria
Rui Conde, comandante da PSP Leiria

O centro histórico à noite é uma preocupação maior para a PSP, no quadro urbano de Leiria?
O Centro histórico foi, é e continuará a ser uma preocupação substancial no quadro global da cidade, por ser uma zona preferencial para a diversão nocturna. Nalgumas fases também em termos diurnos no que toca aos estabelecimentos de hotelaria. E é também o recreio da juventude da cidade e dos alunos do Instituto Politécnico de Leiria. E eles, por si só, constituem-se um incómodo para o morador do centro histórico de Leiria. Duas pessoas a conversar na rua não farão, à priori, ruído que incomode quem queira dormir, 200 pessoas já serão um problema.

 E isso traduz-se em quê? Em alteração da ordem pública? Em pequena criminalidade?
Existe alguma pequena criminalidade. Dir-me-ão “ahhh aqui há muito tráfico de droga”. O tráfico de droga é relativo. Para uma pessoa que não está habituada a lidar com a situação, ver alguém a passar um pacotinho a outro, se calhar estamos a falar de 2,3 ou 4 doses. Obviamente que estamos atentos, estamos preocupados, temos feitos detenções no local, temos inquéritos em curso, mas não temos nenhuma situação que seja relevantemente preocupante nesses termos. A criminalidade denunciada em termos gerais tem vindo a baixar desde 2009 no centro histórico. Tivemos algumas incidências há um ano e meio, sobretudo no período diurno, de roubos a pessoas, mais pela proximidade dos multibancos. Foram feitas várias vigilâncias, várias detenções, ficaram pessoas em prisão preventiva (algumas ainda estão), outras foram julgadas e condenadas, estão a cumprir pena ou a aguardar a decisão judicial. Estamos preocupados porque temos que manter um status quo da situação, não estamos preocupados porque não aparecem situações relevantes em termos criminais.

 E durante o dia?
No ano passado, no período diurno, tivemos algumas situações de burla nos actos de pagamento nas lojas, algum furto de alumínio, são situações para as quais temos vindo a alertar as pessoas e a fazer um esforço grande no sentido de as combater muito directamente. O período diurno não nos preocupa muito. Não é por isso que deixamos de aplicar recursos na área, continuamos a aplicar. No período nocturno temos recorrido a pessoal do departamento de investigação criminal, das equipas de intervenção rápida, das brigadas de fiscalização e alguns do trânsito.

 É suficiente esse dispositivo?
Nunca é suficiente. Seja no centro histórico de Leiria seja no centro histórico de qualquer outra cidade do mundo. Para si e para mim, como meros clientes da zona, não é suficiente porque nós preferíamos ter um polícia a cada dois metros, um a andar à nossa frente e outro atrás.

 Não podendo ser assim, quantos polícias é que tem lá?
Depende. Privilegiamos como é óbvio as noites de quinta-feira, as de fim-de-semana e temos lá entre os 2/3 homens até 14/16, tudo pode acontecer. Agora, nem sempre os polícias andam com uma bandeira a dizer “estou aqui”, ou com coletes reflectores como muita gente gostaria de ver. Uma coisa é certa: aquilo que é relevante controlar no centro histórico de Leiria é controlado. Problema sobrante: tem duas ou 3 vertentes específicas. É preciso decidir se pretende que o centro histórico seja uma extraordinária zona residencial ou seja aquilo que tem sido (e quer tem sido fomentado ao longo dos anos) zona de diversão nocturna por excelência da cidade de Leiria, e arredores. E aqui temos que contar com toda a juventude da cidade que está autorizada a sair à rua, e alguns deles que tinham idade para estar em casa a ver os desenhos animados e a ver o Vitinho. E estes acrescidos dos milhares de alunos que frequentam o IPL. A nossa juventude não prima pela educação, por saber respeitar os outros, o descanso dos outros. Mas isso também é um bocado a irreverência típica da juventude.

 Na sua opinião o problema do centro histórico é de falta de civismo?
É um problema educacional. Que polícia nenhuma consegue resolver. Não podemos colocar rolhas na boca das pessoas, não podemos fazer como nos filmes e colar aquela fita com 5 cm de largura, de cor prateada na boca das pessoas, e em muitas situações em que a polícia se desloca para resolver um problema de ruido na via pública, onde pretensamente um grupo de jovens estará a impedir um casal do seu merecido descanso, a polícia chega lá e depara-se não com um pequeno grupo mas com 50, 100 ou 200. Onde normalmente a chamada de atenção por parte da polícia leva a que nasça no momento uma onda de ruido muito superior, de intensidade muito maior e perpetrada por muito mais gente.

 Mas é hábito a polícia fazer acções de prevenção e sensibilização na ruas?
Nós não poderemos propriamente fazer acções de sensibilização na via pública. Porque o problema não é exactamente dos estabelecimentos, a maioria deles não verte barulho do interior para o exterior. São sim os seus clientes antes, durante (quando vêm cá fora) e depois. Ou até os clientes de outros estabelecimentos, ou alguns que não são clientes de estabelecimento nenhum, que são meros utentes do espaço, e não podemos impedir que eles façam barulho. A juventude sobretudo não está vocacionada para pensar nesses pormenores, nem para respeitar, e cada vez menos até para respeitar a autoridade.

 Na sua opinião, se a criminalidade tem baixado, se não existe um registo de ocorrências elevado, das duas uma: ou os distúrbios não são participados à polícia ou a situação está a ser empolada?
Efectivamente a situação criminal é melhor. Efectivamente a situação tocante ao civismo e ao respeito, é pior. Efectivamente existe aqui um empolar da situação que provirá em parte do cansaço das pessoas, de não serem respeitadas no seu espaço, na sua habitação,no seu descanso, em parte também pela comunicação social. Há algumas histórias que eu ouço desde que cá cheguei, como por exemplo actos sexuais na via pública, efectivação de necessidades fisiológicas, seringas abandonadas no chão, em dois anos e três meses já fui centenas de vezes, a horas diferentes, às vezes a calcorrear as ruas todas e até sozinho, à civil, e nunca consegui ver nada disto. Dou de barato que alguma situação destas tenha acontecido, e tenha havido alguma propagação, que haja algumas situações de criminalidade menor que não sejam comunicadas oficialmente à polícia. E aquilo que não chega não existe. Dou de barato que alguns comerciantes, alguns utentes e até alguns moradores também não gostem que a polícia autue as viaturas em transgressão, que são muitas. O que temos aqui é um cocktail que é feito sobretudo por alguma compreensão deficiente por parte de muita gente, por algum incumprimento por parte de outros. E por alguma incapacidade real de resolução por parte de outros. Se eu não os posso retirar da via pública porque simplesmente estão a conversar, tenho uma sensação de incapacidade. Não é que eu seja o responsável, mas ela existe. Agora, sem dúvida vai ter que ser feita uma escolha. Eu não acredito num sistema misto. Que uma boa zona de diversão nocturna seja uma boa zona habitacional. Darei a mão à palmatória se me mostrarem o contrário.

 Ou seja, a redução de horário não vai resolver o problema?
Eventuais alterações irão certamente diminuir o número de pessoas a partir de certa hora no centro histórico a circular na via pública. Já vi muita gente no centro histórico, perfeitamente implantada no terreno, devidamente servida de bebidas alcoólicas sem recorrer a qualquer estabelecimento local e em estados impróprios para gente daquela idade. E esses vão continuar a fazer a mesma coisa. Uma noite de praxe estudantil não carece de estabelecimentos similares de hotelaria abertos. Podemos proibir as pessoas de circular na via pública? Toda esta situação é complicada. Por outro lado, a movimentação no centro histórico de Leiria, com ruas estreitas, dezenas de paralelos e perpendiculares, muitas ruas onde quase não cabe uma viatura, ruas difíceis de vigiar pelo emaranhado do formato teia de areia que desenvolvem no mapa… o facto de serem muito frequentadas obviamente diminui a probabilidade do crime maior. Diminuindo a frequência do centro histórico, se cair a pique – em função do horário dos estabelecimentos, isso poderá trazer problemas acrescidos, de outra ordem de grandeza. Fecho de empresas, mais algum desemprego. Não é um problema meu, mas poderá ter consequências futuras que sejam um problema meu…

 A videovigilância virá dar um contributo nesse aspecto?
Se auxilia? Auxilia no visionamento das ruas. De se conseguir ver que uma montra é partida. Mas é sempre preferível conseguirmos evitar a montra ser partida. Porque sabemos que este tipo de gente trabalha numa franja temporal que ronda os 30 segundos e 1 minuto e meio. Portanto, desde verificar que estão a partir uma montra, accionar um meio e chegar ao local – e temos muitas ruas ali que basta deixar uma viatura num sítio para obrigar a uma manobra grande para conseguir lá chegar, digamos que a probabilidade de êxito é muito baixa. A videovigilância é um meio óptimo enquanto meio complementar, de recolha de prova, etc. Mas a videovigilância não impede coisa nenhuma. E no que toca àquilo que as pessoas se queixam no centro histórico que é o importunar do descanso, a videovigilância não resolve coisa nenhuma. Temos que continuar a sensibilizar as pessoas para respeitar? Sim. Mas essa sensibilização tem de ser feita em casa, na escola, por todas as entidades que têm competência nessa matéria.

Paula Sofia Luz
paula.sofia@regiaodeleiria.pt

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