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Play it, Sam: God Bless America

O nome Bobcat Goldwaith não soará familiar à esmagadora maioria dos leitores. Mas falando no Zed da série de filmes “Academia de Polícia”, é provável que a memória de muitos seja avivada pelo bandido de voz estridente e trejeitos faciais que se tornou polícia.

João Melo Alvim, advogado jmalvim@gmail.com

O nome Bobcat Goldwaith não soará familiar à esmagadora maioria dos leitores. Mas falando no Zed da série de filmes “Academia de Polícia”, é provável que a memória de muitos seja avivada pelo bandido de voz estridente e trejeitos faciais que se tornou polícia.

Mas o que o traz aqui não tem nada a ver com esse longínquo passado, mas sim com o seu mais recente filme como realizador, “God Bless America”. O filme, muito provavelmente, passou despercebido do público e crítica e, como tantos outros, não devia. Não se trata de uma obra-prima que se tornará incontornável na História do Cinema, mas é uma reflexão cáustica e excecionalmente bem conseguida sobre o estado a que a nossa sociedade chegou. Frank (Joel Murray) é um homem de meia-idade, divorciado, sem expectativas de futuro profissional ou amoroso que, um dia, confrontado com uma das inevitabilidades da vida, resolve reagir. E reage à “americana”, desatando a matar todos aqueles que, de uma forma ou de outra, contribuem para uma sociedade que glorifica a estupidificação, principalmente através de concursos televisivos de “talentos” ou da “vida real” ou de discursos políticos extremistas. O percurso deste “cruzado” é cheio de percalços, principalmente quando uma teenager algo problemática resolve também ajudar à “limpeza”, o que contribui para o tom satírico com que Goldwaith filma. Inevitavelmente, o final não pode ser feliz, mas não deixa de ser uma das surpresas mais interessantes do ano. E algo que deixa qualquer um a pensar. Aliás, já Woody Allen dizia que a vida imita a má televisão. Nunca teve tanta razão como hoje, em que o ciclo vicioso entre vida e televisão e o “querer (a)parecer” é um dos principais responsáveis por uma sociedade egoísta, impreparada e ignorante.

(texto publicado na edição em papel de 29 de junho de 2012)