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Play it, Sam: O amor acontece (parte I)

Em “Titanic” havia mais química entre o iceberg e o barco que entre os protagonistas.

João Melo Alvim, advogado jmalvim@gmail.com

Ainda hoje estou para ver uma história de amor tão excepcional como “Casablanca”, de Michael Curtiz.

Um bom romance só funciona se houver um argumento inteligente, química entre actores e, normalmente, um final dito infeliz. Há casos em que o argumento se pode apoiar em ironia refinada ou num humor muito próprio, mas só um mestre consegue ir além do drama normalmente associado ao romance, já que a maioria das comédias românticas são de consumo imediato. Em “Casablanca” há um contexto (2ª Guerra Mundial) que é brilhantemente posto ao serviço do filme e dificilmente se poderá conseguir voltar a filmar uma relação com tanta intensidade como a de Ilsa e Rick. Não é apenas a ironia enquanto arma verbal, mas a noção de dever e de sacrifício a contender com um sentimento puro numa época de enorme confusão. O fim é infeliz, mas foi, como sabemos, o início de uma bela amizade. E foi mais ou menos assim em “E Tudo o Vento Levou” de Victor Fleming. “Annie Hall”, de Woody Allen é o case study da história de amor com humor. “Diário da Nossa Paixão” de Nick Cassevetes ainda surpreende, apoiado apenas na química do par e num argumento bem trabalhado, por contar uma vida de amor ameaçada pela própria vida. Já “Despertar da Mente” de Michael Gondry foi mais longe, contando uma destruição premeditada de um amor: é um marco esta ideia de desconstrução (e um argumento brilhante), mas aqui rejubila-se com o final feliz, atendendo ao ponto de partida. Referência ainda para “As Pontes de Maddison County” ou um duro a mostrar que também sabe filmar um romance. Por esta semana fico-me por “Titanic”, o final infeliz que mais me merece aplausos: não só o argumento era indigente como havia mais química entre o iceberg e o barco que entre os protagonistas.

(texto publicado na edição em papel de 18 de Novembro de 2011)