Durante muito tempo, se me perguntassem qual a maior conquista democrática do 25 de abril, não hesitaria em indicar o voto livre. Pouco a pouco, porém, essa certeza foi dando lugar a um ceticismo amargo, à medida que a política se tornou um feudo dos partidos, que a transformaram num sistema blindado capaz de anular o efeito do voto livre. Esta evidência nem precisava das recentes teses de doutoramento que vieram confirmar que em Portugal (como no resto da Europa, aliás) os eleitores não elegem senão os candidatos que os partidos lhes impõem, da mesma forma que, dentro dos partidos, as “bases” escolhem os líderes propostos pelas respetivas comunidades de eminências mais ou menos pardas, que os engendram num complexo cozinhado de interesses. O pior é esses interesses raramente coincidirem com os dos eleitores ou os do país, pois os eleitos logo esquecem o que prometeram ou fazem exatamente o contrário disso.
Assim, sempre que sou chamado a votar, vejo-me realmente embaraçado. Votar? Não votar? Em quem? Nulo? Branco? Sinto-me gozado por esta partidocracia que, cinicamente, quer que seja eu a indicar quais, dos mesmos que têm destruído este país, devem ser premiados com uma vida dourada de ordenados e reformas, imunes a qualquer austeridade, lá para Bruxelas e outras babilónias.
//= generate_google_analytics_campaign_link("leitores_frequentes_24m") ?>Mas vou votar, como sempre. De protesto, como nunca. Por isso, não há de ser em nenhum dos mesmos.
(texto publicado na edição de 22 de maio de 2014)